Para onde suas rodas te levam?

Para onde suas rodas te levam?

Houve tempo em que se duvidava de que uma pessoa em cadeira de rodas conseguisse ir a algum lugar que não fosse à porta de casa ou, no máximo, ao consultório médico ou à igreja. Há 50 anos, no Brasil, a imagem que se tinha de um cadeirante era a de uma pessoa triste, com cobertor sobre as pernas.

Pessoas usando muletas às vezes eram vistas em semáforos vendendo balas, mas era raro encontrar uma pessoa com deficiência inserida no mercado de trabalho formal. Quando alguém adquiria uma deficiência, o desespero se instalava, porque nosso imaginário estava povoado de imagens infelizes, mostrando pessoas marginalizadas, condenadas à inatividade, a uma vida à parte.

Décadas depois, o país não avançou tanto quanto gostaríamos – ou necessitávamos. Porém, hoje, muitas pessoas com deficiência estão ocupando os bancos escolares, usando o transporte coletivo, se inserindo no mercado de trabalho, tendo acesso a lazer e a turismo. Iniciaram um processo de participação ativa na sociedade, buscando a inclusão, ou seja, o direito de estar misturadas à sociedade, e não segregadas a determinados espaços.

Acredito que está próximo o tempo em que grande parte de nós poderá afirmar que nossas rodas podem nos levar, sim, aonde nós quisermos. Não porque as condições serão as ideais (um dia eu espero que sejam sim!), mas porque nossa autoestima está cada vez mais fortalecida e estamos a cada dia mais empoderados.

 

Duas passagens aéreas e um avião de brinquedo sobre o teclado de um notebook

Que nossas rodas possam nos levar aonde nossos sonhos nos conduzirem!

 

Aniversário do Cadeira Voadora

 

Quem me acompanha pelas redes sociais, sabe que o blog está fazendo 5 anos. Para celebrar a data, em dezembro propus uma promoção.

Numa parceria com a loja Laço de Chita, ofereceremos um vale-compras para pessoas com deficiência que postassem uma foto em uma situação de viagem. A foto deveria mostrar o equipamento usado para se locomover e ser acompanhada de um comentário, em poucas linhas, explicando por qual razão viajar é algo importante para a pessoa e de que forma a falta de acessibilidade dificulta as viagens.

A proposta era aceitar também fotografias da pessoa na cidade onde ela vive, desde que a imagem a mostrasse em uma situação de lazer. Afinal, poderia haver aqueles cujas limitações os impedissem de fazer deslocamentos maiores.

No post que lançava a promoção (você pode lê-lo aqui), informei que as fotos seriam publicadas em um artigo no blog, e aqui estão elas!

Reinventando a vida

 

No conjunto, essas fotos trazem experiências relevantes de indivíduos que contornaram dificuldades, reinventaram suas vidas e estão batendo asas apesar dos desafios de acessibilidade, que não são poucos.

Acredito que as pessoas que enfrentam esses desafios estão colaborando para que as cidades se tornem cada vez mais acessíveis. Isso porque, ao deixarmos nossos lares e depararmos com dificuldades, nos juntaremos àqueles que reivindicam o respeito ao direito de ir e vir com conforto e segurança.

Ou você acha que alguma coisa teria mudado se nós, pessoas com deficiência, continuássemos confinados em casa lendo livros ou vendo TV?

Vamos, então, às fotos? Publico aqui até mesmo aquelas que não cumpriram todos os critérios para participar da promoção, ok? Ao lado da foto, colei os comentários da própria pessoa.

E eu não poderia deixar de agradecer aos que dividiram suas experiências conosco! Que cada um se sinta abraçado neste momento, por todos nós!

 

Vou ali, ao shopping, e chego até o Nepal

 

Meire Elem Galvão

Foto tirada no ano de 2013 em Ouro Preto/MG. Nesse momento eu falava sobre a importância de um transporte acessível.

Viajar para mim é importante porque quem vai volta cheio de contos, recordações e conhecimento.

A falta de acessibilidade dificulta a aproximação, a exploração e em algumas vezes a realização do sonho.

Eu tinha o sonho de conhecer Ouro Preto, mas devido à quase inexistente acessibilidade, não pude me locomover pela cidade. Fui sacolejando na cadeira (devido aos desníveis do calçamento e à ausência de calçada acessível) até um museu e tive que ser carregada para entrar no restaurante e almoçar.

 

Joana d"Arc passeia em um shopping após 7 anos saindo apenas de ambulância

Joana d”Arc passeia em um shopping após 7 anos saindo apenas de ambulância

Joana D’arc

Quando estive tetraplégica, só usava ambulância para meus deslocamentos.

Após 7 anos de terapia intensa voltei alguns movimentos e posso usar cadeiras de rodas, e já consigo ir ao shopping e algumas vezes a reuniões com amigos. É difícil, mas aos 77 anos e rodeada de muito amor eu consigo…

Barreiras físicas ainda dificultam muito também o acesso a vários locais, passeios mal conservados, falta de entradas adequadas para cadeirantes, rampas mal planejadas, falta de elevadores com espaço suficiente para o cadeirante e um acompanhante em alguns locais, falta de estacionamentos adequados e sinalizados.

Enfim, várias dificuldades, mas persistir sempre!!!

 

 

Eneida está no Jardim das Sensações, em Curitiba.

Eneida está no Jardim das Sensações, em Curitiba.

Eneida Melo

Esta é uma foto que tirei em setembro de 2012, no Jardim das Sensações, localizado no Jardim Botânico de Curitiba-PR.

É um jardim lindo, organizado de forma a permitir que pessoas com e sem deficiência possam aproveitar cada presente que a natureza nos oferece, seja em cores e cheiros de plantas e flores, seja em sons que acalmam, como o barulho da água caindo nas pedras, nesta queda d’água mostrada na foto.

Viajar significa, para mim, renovar a minha alma e me faz olhar o presente com gratidão. Gratidão pela vida, por estar nesse mundo em constante aprendizado, por conhecer pessoas e lugares que me encantam.

No Jardim das Sensações, senti paz com tanta beleza ao redor e também me senti acolhida, porque esse lugar foi construído para incluir todos.

Mas nas viagens, infelizmente, não é sempre que me deparo com espaços acessíveis como esse, o que me traz o sentimento de medo e receio de dificuldades que poderão surgir em razão disso.

Assim, viajar exige de mim muita coragem para superar a acomodação e partir. Partir para o desconhecido, para o desafio e também para brindar a vida!

 

Thaíse posa para foto entre duas belas araras

Thaíse posa para foto entre duas belas araras

Thaíse Maki

VIAJAR deveria ser mais REGRA que exceção na vida de qualquer ser humano. É a forma como podemos fugir da nossa rotina, sorrir por razões diferentes, descobrir sensações inimagináveis…

A foto ao lado foi tirada em Lujan – Buenos Aires/Argentina… Um dos passeios mais fantástico que já fiz…

Minha cadeira foi guerreira, porque aguentar a Thaíse e os caminhos pelos quais passei para chegar aonde queria não foi fácil. O zoo de Luján, em especial, não oferecia a maior acessibilidade do mundo, mas também economizou nas escadas ao ser construído (o que já ajuda um bocado na vida do cadeirante!).

A companhia também ajudou MUITO para tornar essa viagem perfeita (Sabrina e Mauro… estamos precisando repetir a dose e conhecer novos lugares!!!).

Se você tiver a oportunidade de ir a Buenos Aires, NÃO A PERCA!

 

 

 

 

Frederico está passeando em Nova York

Frederico está passeando em Nova York

Frederico Rios

Estátua da Liberdade, Nova York.

Sempre gostei de viajar, conhecer novos lugares, fazer novas amizades. Porém, após me tornar cadeirante, viajar tornou-se algo bastante complicado, sendo necessário planejar cada detalhe para não transformar algo tão prazeroso em puro estresse para mim e para quem me acompanha.

De todos os perrengues que passo em minhas viagens, certamente os piores são nos aeroportos, geralmente provocados pela falta de estruturas acessíveis e de atendentes preparados.

 

 

Tina está no Nepal. Conforme ela explica, no reino do imaginário tudo é possível!

Tina está no Nepal. Conforme ela explica, no reino do imaginário tudo é possível!

Tina Descolada

Em Vale do Mustang – Nepal

Viajar é imergir em outras culturas para ampliar e enriquecer o meu imaginário… experiências são tudo pra mim!

Escolho quase sempre roteiros de viagem inacessíveis para a realidade de uma pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida. No reino do imaginário podemos tudo, no reino da realidade cada um deve buscar o seu possível.

 

 

 

Na foto, Lúcia está em Portugal com a filha.

Na foto, Lúcia está em Portugal com a filha.

Lúcia Meira | Esta foto tirei em Braga /Portugal em abril de 2012. Fui visitar minha filha que estava estudando lá.

Essa viagem foi especial para mim, pois foi a primeira que fiz sozinha usando cadeira de rodas, além de conhecer vários lugares lindos e acessíveis.

O voo teve escala em Lisboa e fiquei em Porto/Portugal, onde minha filha me aguardava. Só faltou minha filha mais velha para o passeio ser perfeito.

 

 

 

 

Juliana tirou esta foto em Punta Cana, com o marido.

Juliana tirou esta foto em Punta Cana, com o marido.

Juliana Gilza Castro | Esta foto é em Punta Cana, novembro /2012.

Minhas rodas me levam a viver com mais plenitude e a realizar os meus sonhos!

As viagens são importantes para recarregar as baterias…

Dificuldades ? Transponho !

 

 

 

 

Fábio curtiu São Lourenço, apesar dos desafios.

Fábio curtiu São Lourenço, apesar dos desafios.

Fábio Augusto Rocha Vieira

Esta foto tirei em São Lourenço.

Foi uma das melhores viagem que fiz, apesar de alguns obstáculos.

 

 

 

 

 

 

 

Edileuza admirando a vista no Rio de Janeiro

Edileuza admirando a vista no Rio de Janeiro

Edileuza Ferreira da Silva

Esta foto foi tirada no feriado de abril em 2015, uma vista da cidade maravilhosa.

Gosto de viajar para conhecer lugares novos, ou até mesmo uma vista, que pagando não se consegue alcançar no CRISTO REDENTOR. Mas esta vista só foi possível graças ao apoio dos braços fortes do primo.

A cidade “maravilhosa” está longe de ser acessível para cadeirantes, bem como pessoas com dificuldade na locomoção. Apesar de tudo isso, somos brasileiros e não desistimos nunca.

Enquanto não podemos ir a todos os lugares, vamos usufruir das belezas naturais que conseguimos chegar ate lá. Estamos de olho nas dicas que nos são dadas. Que venha o próximo passeio! #viverenaoteravergonhadeserfeliz#2015 maravilhoso

 

 

Prêmio Meire Laço

A ganhadora do prêmio foi a Meire, cuja foto teve o maior número de curtidas. Ela escolheu os itens na loja Laço de Chita, que enviou o presente pelo correio. Obrigada, Laço de Chita, pela parceria! (A imagem é um print do Instagram da loja.)

 

Não deixe a vida fugir

 

Minha mensagem final é: ninguém disse que seria fácil. Mas os resultados compensam.

Sair da zona de conforto, confrontar os próprios limites e expandi-los, a fim de viver novas experiências são atitudes que podem fazer a diferença entre uma vida morna e outra plena de sabor. Com isso não quero dizer que vc necessite ir até o outro lado do mundo.

Conforme observamos, a Joana d’Arc mostrou a relevância que pode ter uma “simples” ida ao shopping. Tudo vai depender do olhar.

 

Viajar para que a vida não escape

“Viajamos não para escapar da vida, mas para que a vida não escape de nós.”

 

 

About Laura Martins

Laura Martins criou o blog Cadeira Voadora em 2011 para compartilhar suas experiências de viagem em cadeira de rodas. Para ela, viajar desenvolve inúmeras habilidades, nos faz menos intolerantes por conviver com as diferenças e ajuda a construir inclusão, porque as cidades vão ficando mais preparadas à medida que as pessoas vão se fazendo visíveis. Entre em contato pelo e-mail contato@lauramartins.net.

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