Porto (Portugal): acessibilidade para cadeirantes

Quem é que poderia imaginar que Porto, uma cidade com tantos morros e edifícios históricos, pudesse oferecer acessibilidade para pessoas em cadeira de rodas? Pois muita coisa foi feita por lá. Venha comigo conhecer!

 

Estou assentada numa mureta baixinha, não se preocupem! À esquerda, embaixo, fica o teleférico. (Todas as fotos pertencem ao acervo Cadeira Voadora)

 

Primeiro, vou te contar um caso

 

Após 9 horas de voo de Belo Horizonte a Portugal, fizemos conexão em Lisboa para pegar o voo até o Porto. Como era a primeira cidade em que parávamos, seria necessário passar pela Imigração.

Ao entregar meu passaporte ao funcionário, ocorreu este divertido diálogo:

— Está indo para onde?

— Porto.

— Com que objetivo?

— Turismo.

Aí veio a parte engraçada:

— Turismo em Porto, de cadeira de rodas???

—  Sim! Porto tem bastante acessibilidade!

Bastante incrédulo, ele perguntou se eu estava sozinha. Fiz que “não” e mostrei Helena, ao meu lado.

Trocamos mais algumas frases, e ele perguntou a Helena se ela tinha ido à academia naquela semana. Rimos muito!

Ele então nos liberou, mostrando-se realmente surpreso diante do fato de que algum cadeirante fosse passear em Porto, subindo e descendo ladeira.

Você vai ver, neste post, que não somente foi possível, como muito agradável.

Senhor funcionário, me aguarde novamente. Porque eu vou voltar, mas desta vez terei fotos para te mostrar!

 

Helena, que me fez companhia nesta viagem, está no mesmo local em que estou na foto anterior.

 

Transporte de qualidade em Porto

 

Para começar, é preciso saber que, no Porto, houve bastante investimento na acessibilidade do transporte, conforme você vai conferir a seguir. Neste primeiro post, vou te passar o máximo de informações a respeito, deixando a parte das visitações para o próximo, a fim de não misturar os assuntos, nem deixar este texto muito extenso.

Me acompanhe!

 

1) Metrô

 

Fico feliz em te contar que o metrô tem praticamente 100% de acessibilidade. Segundo informações que recebi, apenas duas ou três estações não são acessíveis, mas elas não têm interesse turístico.

Apesar de ter usado o metrô poucas vezes, ele me pareceu seguro, confortável e limpo. Porém, nenhuma delas foi no horário do rush

Em uma das ocasiões, notei que não havia praticamente nenhum vão entre a plataforma e o trem, o que contribui para a segurança de todas as pessoas, mas é fundamental para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Porém, em outra ocasião, já havia um distanciamento.

 

Onde você vir esta imagem, encontrará uma estação de metrô

Dicas Cadeira Voadora

 

– Atenção: metrô, em Portugal, se pronuncia [métro].

– Pelo menos na primeira vez em que usar o metrô, assim que entrar na estação procure a sala de informações e venda de tíquetes. Pegue mapa e peça as informações que desejar, tudo isso antes de começar suas aventuras pela cidade. Assim, poderá escolher o cartão de transporte mais adequado e se informar sobre acessibilidade. Por exemplo, muitas vezes o elevador não é fácil de encontrar.

– Você também pode consultar o site do Metrô de Porto e até baixar mapas e horários. Para isso, é só clicar aqui.

– Algumas estações estão na superfície, e não no subsolo. Elas têm acessibilidade, mesmo que, a princípio, você não encontre como sair do local.

Se resolver ir de metrô até Vila Nova de Gaia, se assente do lado direito. Assim, terá acesso à belíssima vista do Rio Douro, tendo Porto de um lado e Gaia do outro. Pode acreditar, é impagável. Você pode aproveitar a ida para visitar a loja El Corte Inglés, e, ao voltar, optar por parar no teleférico.

 

Um projecto vanguardista como o Metro do Porto não podia deixar de prever uma mobilidade óptima. Desde logo, a eliminação das barreiras físicas comuns nos transportes públicos foi uma prioridade totalmente assumida. [retirado daqui]

 

2) Transporte ferroviário (em Portugal: comboio)

 

Também recorremos ao transporte ferroviário, na Estação de São Bento, a fim de visitar a Escola da Ponte, que fica em São Tomé de Negrelos. Sem dúvida, a Estação é linda, com seus célebres painéis de azulejo no salão principal.

Achamos o trem bastante confortável para conhecer as aldeias e cidades próximas. Entretanto, apesar de termos tomado providências para avisar que uma das passageiras era cadeirante, houve problemas, tanto na ida, quanto na volta, que te conto aqui. Neste mesmo post, deixei links para adquirir as passagens e saber mais sobre a acessibilidade.

3) Táxi e Uber

 

Pegamos táxi somente uma vez, e Uber todas as outras. Todos os motoristas foram muito gentis e cooperativos. Os carros eram novos e confortáveis, mas não cheguei a perguntar se há táxis adaptados.

Em Porto, Uber aceita apenas cartão de crédito.

Não peguei ônibus. Fico devendo esta informação a vocês. E, sobre aeroporto e viagem aérea, precisarei de outro post, porque, vocês sabem, problemas acontecem durante as viagens, e precisamos de muitas palavras para explicar tudo direitinho… rsrs

 

Acessibilidade em Porto: um trabalho contínuo e consistente

 

Felizmente, Porto era mais acessível do que eu imaginava. Se você conhece cidades históricas brasileiras, como Ouro Preto e Paraty, imagine percorrer estes locais quando respeitarem seu direito de ir e vir, tornando os monumentos e prédios públicos acessíveis, tanto quanto possível. Recuperando calçadas, construindo rebaixamentos e por aí vai.

A respeito do assunto, entrevistei os arquitetos Lia Ferreira, Provedora Municipal dos Cidadãos com Deficiência, também cadeirante, e João Pestana, coordenador do Sistema de Itinerários Acessíveis (SIA). Publiquei as duas entrevistas no próximo post, para ter tempo de focar mais no assunto. Elas são verdadeiras aulas e podem ser conferidas no link que deixei abaixo, no Para saber mais.

 

A arquiteta Lia Ferreira é cadeirante e a provedora da Pessoa com Deficiência na Câmara Municipal de Porto. 

 

Cadeira Voadora em Porto: roteiro

 

Para resumir, farei breves comentários sobre os lugares que visitamos e sua acessibilidade, trazendo alguns detalhes para você ter como decidir se encara a empreitada ou não.

Mas, antes, um alerta: só enfrentei alguns morros porque Helena me incentivou e estava com preparo físico invejável. Do contrário, seria difícil.

Não me parece que facilitaria usar cadeira motorizada ou scooter, porque algumas calçadas são estreitas, e algumas ruas têm revestimento de pedras. Isso é terrível, porque a cadeira trepida demais e, algumas vezes, nem sai do lugar.

Sendo assim, se não tiver um empurrador de braços fortes, considere usar os meios de transporte disponíveis. Por outro lado, em algumas regiões, com certeza será possível transitar com cadeira ou scooter.

Vamos deixar de conversa e passar às atrações?

 

Restaurante Cantinho do Avillez

 

Nosso primeiro almoço na cidade foi no Cantinho do Avillez, indicado por um funcionário muito gentil do hotel onde estávamos.

Pelo telefone, informaram que o local tinha entrada acessível, mas foi alarme falso. Há um degrau muito alto na entrada, e o passeio é íngreme. Sendo assim, recorremos a ajuda para subir.

Mas valeu a pena, porque a comida é muito, muito boa (culinária portuguesa contemporânea), com bom custo-benefício. Pedimos o menu do dia (servido até as 15h), que inclui entrada, prato principal e uma bebida. Tudo impecável.

O ambiente é informal e descontraído, e uma estrela no Guia Michelin não o fez proibitivo.

A rua é íngreme e calçada com pedras; não há rebaixamento de calçada (não vimos acessibilidade nesta área). Fomos de Uber, e o motorista nos auxiliou a alcançar o passeio.

 

Região da Estação de São Bento

 

Nesta foto, estou próxima à Estação Ferroviária São Bento. São belos edifícios históricos, mas as ruas são íngremes e de mão única. O calçamento varia entre dois tipos de pedra e asfalto.

A Estação mereceu um post à parte, para que eu pudesse me estender mais. Para ler, clique aqui. Repito o link abaixo, no Para saber mais. Assim, você não precisa interromper a leitura…

 

 

 

Praça da Liberdade

 

Observe, ao fundo, a Câmara Municipal.

Observe também que as ruas e calçadas estão bem cuidadas, sem danos, e muito limpas. O meio-fio é baixo e há rebaixamentos, que estão em boas condições. Sendo assim, é fácil passear por lá.

 

Café Majestic

 

Fizemos um pit stop no belo Café Majestic, por causa da forte chuva. Apesar de não ter acessibilidade, foi fácil entrar e nos acomodar, porque minha cadeira de rodas é mais estreita. Não tem banheiro acessível.

É muito bonito, os funcionários são gentis, e amamos os scones, acompanhados de espumante…

 

 

Região do teleférico

 

Tecnicamente, o teleférico não se localiza no Porto, mas em Vila Nova de Gaia, do outro lado do Rio Douro. E é um passeio que te indico fortemente, por causa da vista lindíssima.

Esta foto foi tirada no parque ao lado. As três últimas foram tiradas de dentro do teleférico. Após, segue um videozinho.

Para chegar lá, é só pegar o metrô indo para Gaia e descer na primeira estação após a ponte. Cuidado na travessia, porque é tudo muito bonito, então a gente fica meio boba e corre o risco de ser atropelada.

 

O teleférico é acessível?

 

A infraestrutura recebeu muita atenção para a acessibilidade, conforme você perceberá. Como entramos pela parte alta, é sobre esta entrada que te informo, combinado?

Na parte alta, primeiramente tem uma rampa para acessar o local onde se localiza a bilheteria e a sala de onde parte o teleférico. Como fomos em baixa temporada, não havia fila em lugar algum, mas, se houver, passe na frente e verifique se há prioridade para cadeirantes, porque não me lembrei de perguntar.

Compramos os tíquetes na lojinha, no final da rampa, à direita. Depois, pegamos o elevador para o local de embarque.

Nos disseram que era tudo acessível. Mais ou menos.

Falaram que a cápsula pararia para que eu entrasse, mas não foi bem assim. Na realidade, é o funcionário que segura a cabine para que pessoas com mobilidade reduzida consigam entrar com mais segurança. Porém, não conseguiram pará-la totalmente, e ela não ficou exatamente em frente à plataforma, o que criou um vão.

Como eu e Helena somos fobadas, não pedimos para que a situação fosse corrigida e entramos assim mesmo. Resultado: quase tomei um tombo que teria sido grave.

Por isso, caso opte por fazer esse passeio, procure ter calma. Se o teleférico passar sem que consigam pará-lo, virá outro em seguida. O importante é ter segurança para entrar e sair, e não correr risco sem necessidade.

O passeio dura cerca de 5 minutos e, para desembarcar, não houve problemas. Ah! Você vai encontrar banheiro acessível no final do percurso.

Para arquitetos e curiosos: neste site, mais informações sobre a acessibilidade na parte baixa (final da descida, à beira do rio). Aqui, na parte alta.

 

 

Neste vídeo, com dois segmentos, mostro a parte alta, por onde entramos. Depois, filmo de dentro da cabine, te mostrando a vista.

 

 

Vila Nova de Gaia

 

Assim que descer do teleférico, você estará em Gaia.

Ao longo deste trecho do Rio Douro, vai encontrar bares, restaurantes, loja e feirinha de artesanato e as famosas caves (armazéns) de vinho do porto.

Não tivemos muito tempo para checar se havia alguma acessível. Infelizmente, as que encontramos pelo caminho não tinham como receber cadeirantes.

Mas a região é bonita, plana e propícia para circular com a cadeira de rodas. Está tudo bem cuidado.

Nas fotos abaixo, observe as passarelas construídas no piso, para evitar as pedras, assim como os bancos e barcos à beira do Douro.

 

 

Cais da Ribeira

 

Bonita e charmosa, a região concentra uma quantidade imensa de bares e restaurantes.

Turistas ficam transitando para lá e para cá, ou estacionados em alguma cadeira, se esbaldando com a boa comida e o bom vinho da região.

Nessa área, a maioria dos locais tem um preço mais salgado. Mesmo assim, nos assentamos em um bar na beira do rio para viver a experiência muito rara de ver o tempo passar e o dia cair. Em frente, os bares e armazéns de Gaia vão acendendo as luzes pouco a pouco. Uma cena belíssima, para registrar na memória.

É possível passear com relativa tranquilidade usando cadeira de rodas ou scooter, mas não encontramos bares e restaurantes com acessibilidade. Ficamos em um que tinha apenas um degrau, e o garçom nos ajudou a transpô-lo.

Para retornar ao hotel, não consegui descobrir se táxis ou Uber podem descer a ladeira, já que é uma área de pedestres. Subimos um morrinho a pé, porque queríamos passear mais, e chamamos o Uber após alcançarmos a parte plana.

A região é realmente linda. Sem nenhuma dúvida, vale o passeio.

 

 

Quantos dias ficar na cidade?

 

Antes de qualquer coisa, uma certeza: Porto não é cidade para um bate e volta. Por sua beleza e história, assim como pela gastronomia, sem dúvida vale a pena dedicar alguns dias a conhecê-la.

E não creia naqueles que lhe falarem que três dias são suficientes. Sim, podem até ser, mas apenas quando o que se deseja é uma visão superficial. Além disso, se você for uma pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, é importante respeitar seu próprio tempo, considerando todas as suas necessidades, desde um bom banho até as horas de sono, passando pelo tipo de deslocamento. Para mim, o nome disso é auto-amor.

Se eu fosse você, destinaria no mínimo cinco dias a percorrer as lindas ruas e construções históricas, fazer uma visita a Gaia e, quem sabe, um passeio de barco até as vinícolas…

Nós só ficamos três e nos arrependemos.

Um abraço super apertado,

Laura

[Posto atualizado em junho de 2023]

 

Para saber mais:

 

Torre dos Clérigos e entrevista com Lia Ferreira e João Pestana, falando sobre a construção da acessibilidade em Porto. Aeroporto.

Estação de São Bento: acessibilidade

Como chegar à Escola da Ponte

 

Portugal neste blog!

 

Hotéis acessíveis em Porto, Barcelona e Madri

Visitando Lisboa em cadeira de rodas

Visitando Lisboa em cadeira de rodas 2

De cadeira de rodas em Portugal: Queluz, Cintra e Alentejo

 

About Laura Martins

Laura Martins criou o blog Cadeira Voadora em 2011 para compartilhar suas experiências de viagem em cadeira de rodas. Para ela, viajar desenvolve inúmeras habilidades, nos faz menos intolerantes por conviver com as diferenças e ajuda a construir inclusão, porque as cidades vão ficando mais preparadas à medida que as pessoas vão se fazendo visíveis. Entre em contato pelo e-mail contato@lauramartins.net.

2 Comments

  1. Jose Mauricio Machado Marinho

    Fantástico

    Sou cadeirante,e achava que isto não seria possível

    • Pois é, Maurício… Muita gente achava que não seria possível. Hoje publicarei mais um post sobre o assunto, então ficará mais claro o Sistema de Itinerários Acessíveis. Depois dê uma conferida!

      Abraço e obrigada pela visita!

Comments are closed