Aviso aos comerciantes: a pessoa com deficiência também é consumidora

Comerciantes e empresários precisam estar atentos às necessidades específicas das pessoas com deficiência, para atender e prestar seus serviços com o respeito e a dignidade que esse público merece e tem direito. O post de hoje é da advogada Meire Elem Galvão.

 

A rampa portátil pode ser uma opção em alguns casos, mas ela precisa oferecer segurança e autonomia. (Foto: Acervo Laura Martins)

 

Post de 25/11/2015, atualizado em 29/08/2020

 

Onde estão as barreiras?

 

Queridos leitores, hoje quero falar sobre pequenos voos, aqueles que tentamos realizar no bairro em que moramos.

Você provavelmente encontrará menos barreiras – arquitetônicas e atitudinais – da sua casa até Paris, do que no trajeto da sua casa até o salão de beleza mais próximo, se é que você conseguirá adentrá-lo.

E não pretendo falar apenas como advogada, mas sim como consumidora, que se sente desrespeitada e invisível para a maioria dos comerciantes/empresários.

Este texto é direcionado principalmente a eles, mas, se você é pessoa com deficiência, não deixe de ler e compartilhar, pois quem está informado está empoderado, e o poder pode promover grandes mudanças.

 

Alô, alô, empresário!

 

Se você tem uma lojinha de artigos de presente, um salão de beleza, uma lanchonete em um bairro da periferia, ou uma casa de show, um café, um restaurante requintado na área nobre, leia este texto.

Talvez você nunca tenha pensado nas observações que pretendo fazer nestas linhas, mas, tenha certeza, elas podem fazer a diferença na vida de muitas pessoas e também no seu negócio. E o melhor: não são necessários grandes investimentos para isso.

 

A Confeitaria Colombo do Forte de Copacabana (RJ) tem mesas na mureta em frente ao mar, com rampa móvel para acesso do cadeirante. (Foto: Acervo Laura Martins)

 

O que você pode e deve fazer

 

As pessoas com deficiência representam 23,9% da população, segundo o censo realizado pelo IBGE em 2010. Talvez você pense que não, mas muitas dessas pessoas trabalham ou recebem benefício/aposentadoria, ou seja, possuem fonte de renda, potencial de consumo e necessidades consumeristas como todas as outras pessoas.

O comerciante/empresário precisa estar atento às necessidades específicas dessa grande minoria, para atender e prestar seus serviços com o respeito e a dignidade que o consumidor com deficiência merece e tem direito.

Se você já tem seu negócio ou pretende abrir um, verifique se a calçada é rebaixada, construa rampa (com inclinação adequada) na entrada e, se necessário, dentro do comércio. Além disso, procure instalar faixa direcional para cegos, dentro do estabelecimento e no entorno.

 

Acima: Centro de estética em Belo Horizonte dispõe de maca eletrônica regulável em altura em todas as salas. (Vídeo: Acervo Laura Martins)

 

Oriente seus funcionários a respeitar a lei que garante o atendimento preferencial às pessoas com deficiência. Não subestime a pessoa com deficiência, tratando-a como uma pessoa incapaz até mesmo de manifestar vontade. Converse diretamente com ela (mesmo se estiver acompanhada) e pergunte se necessita de auxílio e qual seria. Incentive seus funcionários a aprender a língua de sinais.

Com relação ao ambiente, os corredores precisam ter largura mínima de 90cm, é preciso haver balcão de atendimento rebaixado, sanitários adaptados e que não fiquem trancados, assim como espaços livres para que pessoas em cadeira de rodas possam aguardar atendimento.

Em loja de roupas é imprescindível provadores espaçosos, desocupados, que não estejam servindo de quartinho da bagunça.

 

Salão de beleza da Flávia Marinho, em Belo Horizonte, recebe os cadeirantes com dignidade: o balcão é rebaixado.

Salão de beleza da Flávia Marinho, em Belo Horizonte, recebe os cadeirantes em balcão rebaixado. No local, também há toalete adaptado. Saiba mais aqui.

 

Legislação sobre o assunto

 

Entrou em vigor, em Belo Horizonte (MG), a Lei Municipal nº 11.049, de 31/5/2017, que prevê a obrigatoriedade de os estabelecimentos que comercializam artigos de vestuário e similares instalarem, no mínimo, um provador adaptado e acessível às pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Está prevista, na lei, a aplicação de multa no caso de descumprimento, o que significa que a situação pode ser denunciada.

O art. 56 do Código de Defesa do Consumidor prevê punição para os estabelecimentos que desobedecerem ao disposto na legislação. Além disso, condiciona  a concessão e renovação de alvará de funcionamento à comprovação de que o estabelecimento está cumprindo as regras de acessibilidade.

Encontrei também legislação semelhante no Rio de Janeiro: a Lei Estadual nº 7.443, de 7/10/2016.

 

Adaptações em edifícios

 

Para as adaptações arquitetônicas em edificações, mobiliário, espaços e equipamentos, é necessário observar os critérios e parâmetros técnicos de acessibilidade estabelecidos pela Norma da ABNT 9050/2020. Você pode acessá-la clicando aqui. Também pode contratar um arquiteto que esteja adequadamente informado*.

A sociedade vem se transformando, criando um ambiente para que todos, sem exceção, possam viver com autonomia, segurança e dignidade. E as “cadeiras voadoras” e todas as pessoas com algum tipo de deficiência têm direito de voar sem limites, em todos os espaços.

Para isso é preciso que você, pessoa com deficiência, conheça seus direitos e exerça-os. Se não for possível, coloque a boca no trombone, pois você não sabe o poder que um cliente insatisfeito tem.

 

O que o cliente pode fazer em caso de desrespeito às normas

 

Se esteve em um local que não respeita as normas de acessibilidade e teve algum direito violado, você pode:

  • Fazer uma representação diretamente ao comércio/empresa, relatando por escrito (em duas vias, sendo uma cópia assinada por quem recebeu o documento fica com você) o que não está correto e como deveria ser. Peça resposta em prazo razoável.
  • Fazer uma representação ao Ministério Público (sem advogado). Ela pode ser feita também por escrito, como orientado acima, ou prestando depoimento pessoal na própria procuradoria.
  • Entrar com uma ação judicial visando inclusive indenização por danos morais, que pode ser ajuizada com auxílio de um advogado.

 

Legislação pertinente

A seguir, algumas leis que tratam da acessibilidade e da integração da pessoa com deficiência, as quais você pode acessar clicando na numeração.

      • Decreto nº 3.298/1999, que regulamenta a Lei nº 7.853/1989, que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência*.
      • Lei nº 10.098/2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência* ou com mobilidade reduzida.
      • Lei nº 13.146/2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).

 

Nota explicativa:

A terminologia adequada não é “portador de necessidades especiais” nem qualquer outro termo, mas sim “pessoa com deficiência”, pois a deficiência não é algo que se possa escolher portar ou não.

Além disso, pessoa com deficiência é, antes de tudo, pessoa. A deficiência só é notada ou passa a existir, de fato, no momento de interação com pessoas e/ou ambientes que não estão preparados para tratá-la e recebê-la. Sendo assim, a deficiência deve ser vista mais como uma questão ambiental e menos como pessoal.

Algumas leis relativas às pessoas com deficiência já sofreram revisão da terminologia empregada, mas outras ainda não.

 

⇒ Se você se interessa pelos direitos da pessoa com deficiência e quer ler outros textos da advogada Meire Elem Galvão, clique aqui.

 

About Meire Elem Galvão

Meire Elem Galvão é advogada, palestrante e divulgadora de informação sobre os direitos da pessoa com deficiência. Conhece de perto os desafios das cadeiras voadoras, pois faz parte desse bando. Ela te convida a visitar sua página no Facebook (@direitosmeireelemgalvao), seu Instagram (@direitosdapcd) e a enviar suas dúvidas para meiregalvaodireito@hotmail.com

3 Comments

  1. AO LER SEU ARTIGO ACHEI POR BEM APOIAR SUA INICIATIVA DE APOIAR PESSOAS COM DEFICIÊNCIA.
    QUERO Q FIQUE REGISTRADO Q A GDE MAIORIA DOS MERCADOS E SUPERMERCADOS DOS BAIRROS DE PORTO ALEGRE.RS (OS DE PEQ E MEDIO PORTE ) N TEM ACESSO FACIL P CADEIRANTES DEVIDO OS CORREDORES SEREM ESTREITOS E OBSTRUIDOS POR CAIXAS E CARRINHOS DE REPOSIÇÃO DE MERCADORIAS.
    APENAS P RESSALVAR ESSE DETALHE JA Q N EXISTE A MINIMA PREOCUPAÇÃO DA FISCALIZAÇÃO QUASE INEXISTENTE EM RELAÇÃO AO ITEM ” ACESSIBILIDADE ” MTO MENOS CULTURA E TREINAMENTOS ADEQUADOS, TANTO P ORGÃOS GOVERNAMENTAIS COMO DOS PROPRIOS COMERCIANTES.
    PARABENS P SEU ARTIGO.
    OBRIGADO P PARTE Q ME TOCA COMO CADEIRANTE.

    • Alberto, obrigada pela visita e pelo depoimento. Juntos, somos mais fortes para mudar esse tipo de situação. Se estivermos bem-informados, nossa ação será promissora, não é mesmo? Forte abraço!

    • Meire Ellem D. C. Galvão

      Alberto, fico feliz que tenha gostado e por poder contar com você na luta pela acessibilidade plena e efetiva. Realmente há pouca ou nenhuma fiscalização no que tange a acessibilidade nos comércios, cabe a nós informar, fiscalizar, cobrar e exigir o exercício de nossos direitos. Sugiro que faça uma reclamação por escrito (como mencionei no artigo) à esses supermercados. Vou aguardar um novo comentário seu dizendo que eles se tornaram acessíveis.

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