Viagem aérea: como se virar durante o voo

Este é o segundo post da série sobre viagem aérea. No primeiro, dei 13 dicas sobre o antes da viagem: compra de passagem, circulação no aeroporto e por aí vai. Agora, o assunto é como se virar durante a viagem. Não é fácil, mas é possível. Você não vai deixar de bater asas por causa disso!

 

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Me lembro bem da preparação para a minha primeira viagem aérea internacional. Seria um voo de 11 horas, e minha principal preocupação era como iria me virar para ir ao banheiro… Na época, era raro encontrar algo na internet a respeito de viagens para cadeirantes.

Telefonei para as poucas amigas cadeirantes que já tinham feito viagens aéreas longas, mas ainda assim me sentia insegura. Apesar disso, segui rumo à Europa sozinha, para encontrar um amigo em Genebra.

Muitas viagens depois, que bom, aqui estou dividindo experiências e muitas dicas com você!

[Post atualizado em 2023]

 

Entrando na aeronave

 

Há vários tipos de cadeira de transbordo, mas são sempre muito estreitas, para poder passar nos apertados corredores das aeronaves

1) O ideal é optar por permanecer com seu equipamento de locomoção até a entrada do corredor da aeronave. Daí em diante, você será transferido para seu assento (em aeronaves pequenas, de um corredor) ou para uma cadeirinha estreita, na qual será levado até sua poltrona (em aeronaves maiores). Seu equipamento será levado por um funcionário até o porão da aeronave. Quem usa muletas poderá ficar com elas, que serão guardadas no bagageiro e retiradas quando necessário.

2) Você precisará orientar o funcionário que guardará sua cadeira de rodas. Explique a ele como dobrá-la e retire a almofada, para evitar que desapareça. Eu a coloco nas costas, mas também é possível viajar sentado nela.

3) Para alcançar sua poltrona, ou ir até o banheiro, as aeronaves maiores e de longo curso possuem uma cadeira de transbordo (aisle wheelchair). Trata-se de uma cadeira bem estreita, com rodinhas, para conseguir passar pelos corredores apertados. Você precisará se transferir para ela e será atado com cintos de segurança para ser transportado até o toalete.

Já aconteceu comigo, mais de uma vez, de os comissários não saberem onde a cadeira estava guardada e também não saberem utilizá-la. Mas não se desespere com isso! No final das contas, sempre conseguiram encontrá-la, montá-la e operá-la, embora visivelmente a maioria não tenha recebido treinamento para isso.

 

O que faço com a bagagem?

 

4) Se estiver assentado na saída de emergência, não será permitido permanecer com sua bagagem de mão (mochilas ou bolsas) na decolagem e aterrissagem. Isso, porque elas podem bloquear a saída em caso de pane.

Caso esteja assentado em outro local, poderá colocar sua mochila debaixo do assento da frente, mas na primeira fileira não há onde colocá-la. Em qualquer caso, seu acompanhante ou o comissário de bordo poderão guardá-la no bagageiro e retirar quando você precisar. Eu mantenho alguns itens numa bolsinha a tiracolo, para usar quando precisar, sem necessidade de solicitar ajuda.

 

Na imagem, é possível ver como se deve acomodar a bagagem de mão.

Na imagem retirada da internet, observamos como acomodar a bagagem de mão.

 

5) Mantenha estes itens sempre com você: documentos (não se separe deles por nada), caneta (você pode precisar de uma para preencher algum documento), celular e cartão de crédito. Seu dinheiro pode ir naquelas pochetes discretas que colocamos por baixo da roupa, que podem ser adquiridas até na revista da Avon.

Em viagens longas, levo na mochila um nécessaire, que retiro e mantenho comigo durante o voo. Ele contém colírio (o olho pode ficar ressecado por causa do ar-condicionado), hidratante labial (pela mesma razão), máscara para dormir e protetor auditivo e lencinho umedecido. Quando a viagem é longa, acredite: é uma bênção poder contar com os lencinhos, tanto para usar nas axilas, quanto no rosto, quanto na higienização no banheiro.

6) Em voos internacionais, você não pode entrar com garrafinha de líquido a bordo, mas pode entrar com a garrafa vazia. Sempre levo uma na mochila, porque algumas companhias não oferecem água em garrafinha, e sim em copo, e gosto de guardar um pouco para tomar quando necessitar. Como o ar-condicionado resseca bastante o ar, podemos precisar de hidratação durante a noite.

 

Uso do banheiro

 

 

Os banheiros das aeronaves são sempre pequenos, mas costumam ser maiores nas viagens de longo curso (Imagem: Google)

7) Se haverá banheiro “acessível” a bordo, só Deus sabe. De qualquer forma, depende do tamanho da aeronave. As de pequeno porte, que fazem voos domésticos e têm apenas um corredor, têm apenas aquela cabine onde somente pessoas magras e crianças conseguem entrar, de tão apertada que é… Observe que coloquei “acessível” entre aspas porque nunca deparei com banheiros de fato acessíveis em aeronaves.

Nas maiores e de longo curso, com dois corredores, que fazem viagens internacionais, era comum que o banheiro fosse maior e até mesmo possuísse alguma acessibilidade.

Na maioria dos voos internacionais que fiz, quando eu precisava usar o banheiro, eles sofriam uma “transformação” para se tornarem usáveis por um cadeirante. Havia dois banheiros, um ao lado do outro – ou um em frente ao outro –, que eram unidos e convertidos em um banheiro maior. Esses banheiros tinham barras de segurança. Nas viagens que fiz nos últimos tempos, não havia esse tipo, infelizmente.

Mesmo havendo, a utilização não é simples. Primeiro, porque nem sempre a cadeira de transbordo conseguirá entrar de forma que a transferência seja confortável para nós. Segundo, porque pode haver alguma turbulência exatamente quando você estiver lá, e o equilíbrio no vaso sanitário ficar instável. Terceiro, porque nem sempre caberá uma pessoa dentro dessa cabine para auxiliar o cadeirante. Quarto, porque nem sempre o banheiro estará limpo, e nem sempre haverá papel-toalha, sabonete e até papel higiênico (mas peça ao comissário para repor, se já tiver acabado).

 

Planejamento é tudo

 

8) Se você usa muletas, então provavelmente terá condições de ir andando até o banheiro. O ideal, porém, é que mesmo assim solicite ajuda de seu acompanhante ou do comissário, só por causa do risco de haver alguma turbulência. De qualquer modo, o pior que pode acontecer é você cair no colo de alguém… hehehe

9) Se você não consegue utilizar o toalete sozinho, é necessário viajar com acompanhante. O máximo que os comissários poderão fazer é auxiliá-lo na transferência para sua poltrona, na acomodação da bagagem e na circulação a bordo. Eles não poderão auxiliá-lo a se alimentar, nem a utilizar o toalete.

10) Procure se programar para ir ao banheiro nos momentos de menor movimento a bordo. Lembre-se de que precisamos de ajuda dos comissários para buscar a cadeira de transbordo, montá-la e nos conduzir a um dos toaletes. Se o pedido for feito em horários mais movimentados, será muito difícil passar no corredor, por causa do fluxo de pessoas. Além disso, nessas épocas de crise econômica, o número de funcionários tem diminuído, o que significa que estão sempre correndo de um lado para outro, procurando atender a todas as demandas.

Mas, caso seja uma emergência, bote a boca no trombone; comunique claramente sua necessidade, sem nenhuma vergonha, e insista, insista mesmo. Não suavize a situação.

 

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Para diminuir as idas ao banheiro

 

11) Em viagens de longa distância, talvez seja interessante voar à noite, para que você possa dormir e assim espaçar a necessidade de ir ao banheiro. Eu vou ao banheiro antes de dormir (logo após o jantar, ou um pouco antes). E acordo antes de todo mundo para ir novamente, assim evito o “engarrafamento” nos corredores. Para saber os melhores horários, converso com um dos comissários e combino tudo.

12) A bordo, tome a menor quantidade de líquido que conseguir, para diminuir as idas ao banheiro. E não se esqueça de que bebidas alcoólicas são diuréticas, portanto é prudente evitar… Para correr menos risco de desidratar durante o voo, tome bastante líquido nos dias anteriores e vá molhando a boca durante a viagem, quando for realmente necessário. Quando chegar ao seu destino, compense essa “dieta” ingerindo bastante líquido!

 

Cateterismo ou fralda?

 

13) Fazer cateterismo ou não?

Esvaziar a bexiga usando uma sonda durante o voo precisa ser uma decisão pessoal, porque cada um sabe das suas condições. Mas não considero esta uma operação simples, porque o uso do banheiro já não é simples quando a gente precisa apenas tirar a roupa para usar o vaso sanitário; imagine quando precisa de higiene e equilíbrio…

 

⇒ Caso opte por fazer:

– Leve na sua mochila um nécessaire com todos os itens de que irá precisar. E guarde-a de forma que seja fácil retirá-la da bagagem.

– Lembre-se de que é comum sair muito pouca água da torneira da pia, e, como eu disse, às vezes o sabonete acaba e não é reposto. Então, programe sua higiene de outra forma.

– Leve um acompanhante; não viaje sozinho! 😉

 

⇒ Caso opte por não fazer:

– Viaje usando fralda descartável, mesmo que não tenha incontinência urinária. Assim, você reduz a ansiedade e faz com calma todo o processo de ir ao banheiro. É assim que faço… Há boas opções de fraldas para adultos no mercado. Então, com antecedência, vale pesquisar as marcas e modelos e fazer testes antes da viagem.

– Para mulheres que não são cadeirantes e têm dificuldade de se assentar no vaso sanitário, por causa dos espasmos ou por outro motivo qualquer: existe um acessório feminino para fazer xixi em pé. Tente encontrar no Google… Não aconselho fazer isso sozinha, se você tem equilíbrio precário. Lembre-se: o avião sempre balança um pouquinho…

 

Dicas espertas

 

14) Caso precise da ajuda do comissário durante o voo, há como chamá-lo utilizando um botão, que, de modo geral, estará no braço do seu assento. Contudo, em geral eles não aparecem, porque estão sempre atendendo inúmeras demandas. O que eu faço quando estou viajando sozinha? Combino com eles de passarem os olhos em mim durante a viagem, ou peço para quem está próximo chamar um comissário.

15) Se você vai viajar por uma companhia estrangeira, aprenda pelo menos algum vocabulário básico em inglês (ou na língua falada pelos comissários) a fim de conseguir comunicar suas necessidades básicas, relacionadas a necessidade de ir ao banheiro, a fome ou a desconforto e dor. De qualquer modo, companhias estrangeiras que voam para o Brasil costumam ter pelo menos um comissário que fala português. Em caso de dificuldades, peça para chamá-lo.

16) Viaje com roupas confortáveis e fáceis de serem retiradas numa ida ao toalete. E não se esqueça de levar agasalho! Nunca se sabe se os comissários vão transformar a aeronave numa geladeira!

 

 

Confie em você!

 

Espero que essas dicas o auxiliem a preparar sua viagem aérea reduzindo as chances de desconforto.

É natural a gente se sentir inseguro nas primeiras vezes. O importante é fazer um bom planejamento e, no mais, confiar na própria capacidade de se reinventar diante dos desafios!

Um grande beijo,

Laura Martins

 

Para saber mais:

 

Guia de Direitos e Acessibilidade do Passageiro com Deficiência em Viagens Aéreas

Viagens aéreas: 13 dicas para evitar problemas

 

Na minha primeira viagem internacional, viajei sozinha para Genebra. Se houve problemas a bordo? Sim, houve. Mas valeu a pena? Claro que sim! Nada como acumular experiência para facilitar os próximos voos!

Na minha primeira viagem internacional, viajei sozinha para Genebra. Se houve problemas a bordo? Sim, vários. Mas valeu a pena? Claro que sim! Nada como acumular experiência para facilitar os próximos voos!

 

 

About Laura Martins

Laura Martins criou o blog Cadeira Voadora em 2011 para compartilhar suas experiências de viagem em cadeira de rodas. Para ela, viajar desenvolve inúmeras habilidades, nos faz menos intolerantes por conviver com as diferenças e ajuda a construir inclusão, porque as cidades vão ficando mais preparadas à medida que as pessoas vão se fazendo visíveis. Entre em contato pelo e-mail contato@lauramartins.net.

4 Comments

  1. Preciso ver a parte anterior….
    Muito bom…

  2. Ótima matéria!!!

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