Visitando Lisboa com cadeira de rodas | Parte 1

Estive em Lisboa no final de 2014. Certamente, a cidade é um bom exemplo de destino encantador em Portugal. Apesar de não ser tão amigável com cadeirantes, ela certamente vale sua visita, pela beleza, pela gastronomia e por muito mais. Além disso, a partir de Lisboa é possível alcançar rapidamente outros locais tão encantadores quanto. Vamos comigo? Vou te mostrar tudo em detalhes!

Enquanto lê o post, que tal conhecer o fado moderno da cantora Ana Moura?

Clique aqui para ouvir!

 

Nossa vontade de conhecer a cidade era muito grande para que a chuva nos detivesse, mas saí com todos os equipamentos necessários…rs

Alguns alertas iniciais

 

Publicarei quatro posts sobre Portugal, que constituem uma compilação de oito textos que publiquei no antigo Cadeira Voadora em fins de 2014.

Não foi nada fácil resumir tanta informação! Por isso, caso deseje conferir os detalhes, deixarei os links abaixo, no Para Saber Mais.

No primeiro post, veremos como é a acessibilidade em Lisboa e faremos alguns passeios. Dando sequência, teremos mais passeios em Lisboa; no terceiro post da série, falarei sobre hotel, acessibilidade no comércio e restaurantes. Por fim, no quarto, vamos passear fora de Lisboa, em Queluz, Sintra e no Alentejo.

 

É a mesma língua, mas…

 

Antes de prosseguir, um alerta sobre o português do Brasil e o português europeu.

Apesar de língua ser a mesma, as diferenças no vocabulário e na pronúncia não devem ser desconsideradas, porque são muitas e podem prejudicar a comunicação.

As telenovelas brasileiras, que caíram no gosto dos portugueses, parecem ter colaborado, e muito, para que eles nos entendam melhor, e o crescente fluxo de turistas brasileiros também.

Ainda assim, tenha paciência com as dificuldades que talvez surjam. E não tenha vergonha de perguntar, caso não compreenda algo. Na verdade, eles terão a mesma dificuldade, e também vão te perguntar.

 

[Post editado em maio de 2022]

 

Vista de Lisboa com Tejo ao fundo.

Vista de Lisboa com Tejo ao fundo. (Todas as fotos pertencem ao meu acervo e foram tiradas por João e Ulysses Martins, exceto quando indicado)

 

Acessibilidade geral

 

Temos notícias, pelos amigos cadeirantes portugueses, que Lisboa vem melhorando no quesito acessibilidade. Porém, de modo geral, as condições ainda deixam a desejar.

 

Calçadas

 

Infelizmente, muitas vias e praças são revestidas com mosaico (a conhecida “calçada portuguesa”). Sem dúvida, são bonitas, mas são escorregadias e irregulares, causando, no mínimo, trepidação.

Quando as pedrinhas começam a se soltar, então, a situação fica crítica, pois isso pode causar acidentes.

Na verdade, grande parte das calçadas por onde passei estava com muitos problemas. Além disso, de modo geral, não há rebaixamentos (“rampinhas”). Quando há, resta um desnível de cerca de 2cm.

 

Transporte

 

Como não usei transporte público, aconselho que leiam os excelentes posts do blog Lisboa (In)Acessível, bastante elucidativos. Clique aqui.

Falando de modo geral, apenas alguns ônibus (autocarros) são adaptados, e algumas estações de metrô são acessíveis…

Como ficamos num hotel com excelente localização, fizemos muitos passeios a pé. Quando precisamos fazer deslocamentos maiores, usamos táxis, o que nem sempre foi uma boa experiência (sobre perrengues com taxistas de Lisboa, clique aqui para ler).

Meus irmãos usaram metrô e me disseram que funciona bem para andantes. Os electricos (bondes) mais antigos são charmosos, mas complicados, porque são pequenos, apertados, têm degrau alto e vivem abarrotados de gente.

Além de tudo isso, há mais um fator que dificulta a vida dos cadeirantes. Lisboa é uma cidade histórica com ruas estreitas, pavimentadas com pedras, e muitas ladeiras. Para piorar, muitas pessoas estacionam o carro sobre as calçadas. Não foram poucas as vezes em que tivemos que andar na rua.

Não, nada disso é motivo para desistir, como verá!

 

Electrico

Os electricos (bondes) mais antigos são charmosos, mas complicados para cadeirantes

 

 

Passeando em Lisboa

 

Mesmo com os desafios que citei, há muitos passeios bacanas que uma pessoa com deficiência física pode fazer em Lisboa. Me acompanhe!

 

Praça D. Pedro IV ou do Rossio / Rua Augusta / Praça do Comércio

 

Felizmente, há áreas planas em Lisboa, e agora vou te apresentá-la!

O Rossio, ou Praça D. Pedro IV, é o coração da cidade. De lá, pode-se alcançar boa parte das atrações turísticas, algumas a pé.

A praça é bonita, com cafeterias e restaurantes no entorno, e o Teatro Nacional de Dona Maria está numa das extremidades. Bem próxima do teatro, está a estação ferroviária, com sua rica fachada.

 

A bela Praça do Rossio

A bela Praça do Rossio

 

Na outra extremidade, temos acesso ao calçadão da Rua Augusta, cheio de lojas bacanas, restaurantes “para pegar turistas” e artistas fazendo performances, uns realmente muito bons. Caminhar pela Augusta rumo à Praça do Comércio é um programa divertido e agradável!

E aqui, como em outros lugares de Lisboa, você vai encontrar algo bom demais: as indefectíveis castanhas portuguesas assadas na brasa, baratinhas, deliciosas, para comer enquanto passeia! Não sei se estão disponíveis em qualquer época do ano, ou se somente no outono… São vendidas em saquinhos com 10 ou 20. Hummmmm!

 

Calçadão da Rua Augusta com arco ao fundo

Anote aí!

 

Em Lisboa, alguns monumentos sobreviveram a terremotos e incêndios e foram preservados sem restauração. São documentos vivos, e isso me impressionou bastante, porque têm uma beleza singular.

Este é o caso da Igreja de São Domingos, cujas paredes guardam as marcas desses acidentes. Não desconsidere esta visita. E se prepare para esquecer a agitação da rua e penetrar numa atmosfera solene, de silêncio e respeito.

Igreja de São Domingos no site Onde Lisboa

Igreja de São Domingos no blog Turomaquia

 

Elevador Santa Justa

 

Para ser sincera, achei uma “roubada”. Mas considere que estive lá em 2014, então alguma coisa pode ter melhorado.

Para começar, deparamos com uma fila grande e desorganizada, exposta à chuva, sem ninguém a quem pedir informação (não sei se isso ocorre sempre, ou se é porque estava em reforma).

Para piorar, a fila não andava, e não havia prioridade para nenhuma categoria. Quando finalmente alcançamos o elevador, compramos os tíquetes com o próprio ascensorista, e foi bem caro*. Não, ele não tinha troco e não aceitava cartão, só dinheiro vivo. Foi aí que descobrimos por qual razão a fila não andava…

O elevador tem estrutura de ferro e cabine de madeira. Leva menos de dois minutos para conduzir algumas poucas pessoas ao miradouro, cuja vista é bem bonita, mas não sei se vale o esforço de enfrentar a fila.

Dali também se tem acesso ao Largo do Carmo e às ruínas do Convento do Carmo. Mas não havia facilidades para cadeirantes: não há rebaixamentos, e a rua é calçada com pedras. As rodinhas dianteiras da cadeira de rodas vão tropeçar e agarrar mil vezes nas pedras.

 

Dica:

 

*Para ter descontos nas atrações, é possível adquirir o Lisboa Card. O cartão pode ser comprado pela internet, nos quiosques do Ask Me Lisboa ou no aeroporto. Com ele, você entra gratuitamente ou com desconto em praticamente todas as atrações turísticas de Lisboa e algumas dos arredores. Além disso, ele lhe permite usar ilimitadamente a rede de transportes da cidade. Está disponível para 24, 48 ou 72 horas, mas desconfio que não seja interessante para cadeirantes, já que em alguns lugares nós não pagamos entrada, além disso não vamos aproveitar muito o transporte público, pois nem sempre é acessível. Porém, cada um precisará avaliar por si a vantagem de adquiri-lo.

 

A bela Praça do Comércio. Observe as faixas pavimentadas com pedra cruzando toda a extensão da praça.

Na bela Praça do Comércio, observe as faixas pavimentadas com pedra cruzando toda a extensão.

 

Praça do Comércio e o belo Rio Tejo

 

À medida que descemos a Rua Augusta, vamos descortinando a praça aos pouquinhos! Por fim, ao atravessar o belo arco triunfal, a visão do Tejo traz mais encanto para a paisagem.

O Rio Tejo é uma imensidão de água que conduz até Lisboa os mistérios do mar, que fica logo ali, bem perto. Para os meus olhos e a minha alma, o Tejo é lindo de doer o coração.

A praça é ampla, cercada por prédios com arquitetura que vai atrair seu olhar. Apesar de os pedriscos dificultarem um pouco a circulação com a cadeira, por toda a praça há faixas pavimentadas com pedra, que podem ser usadas por nós, cadeirantes, como trilhas.

Em volta, há vários restaurantes, com espaço interno e terraço, para você comer ou bebericar algo enquanto admira o entorno e observa os passantes. Para melhorar o que já é bom, alguns restaurantes fornecem cobertores ao cair da tarde…

 

Dica:

Caminhe ou rode um pouco até encontrar a rampa que dá acesso ao deque para o Tejo. Que belo pôr do sol vimos ali! Mas, mesmo sob chuva, o local é lindo. Foi lá que encontrei minhas amigas Tina Descolada e Marta Alencar e aproveitamos para fazer lindas fotos.

 

Tina Descolada e eu na Praça do Comércio, admirando o belo pôr do sol. (Foto de Marta Alencar)

Tina Descolada e eu na Praça do Comércio, admirando o belo pôr do sol.
(Foto de Marta Alencar)

 

O ar de mistério do Tejo é ainda maior quando chove...

O ar de mistério do Tejo é ainda maior quando chove…

 

Cais do Sodré

 

Neste belíssimo vídeo, você faz um passeio de bicicleta ao longo da Ciclovia do Tejo (Cais do Sodré – Belém) ao som de “Cais”, de Rodrigo Leão e Gabriel Gomes.

 

 

 

Oceanário de Lisboa

 

Sem dúvida, um local que crianças de todas as idades vão adorar!

O Oceanário é impressionante, e garanto que não estou exagerando. É o maior aquário da Europa e um dos maiores do mundo e tem o papel de educar para a preservação do meio ambiente.

Mesmo com a pouca iluminação na área do tanque central, é possível ver tudo e se locomover sem riscos. Aliás, não é bem verdade que a gente somente . O que acontece de fato é que todo mundo fica encantado, em outras palavras, hipnotizado.

Algumas pessoas ficam em silêncio, outras falam sem parar, outras ficam emocionadas. No meu caso, fiquei sem fala, por causa do impacto que a beleza me causou.

O tanque central é imenso e tem espécies de todos os oceanos. Ele pode ser observado a partir de vários “recantos”, tanto no piso superior quanto no inferior. Em vários deles há bancos, convidando você à contemplação.

 

Oceanário

Eis o Oceanário repousando sobre as águas. Ninguém suspeita de que vai encontrar um universo tão rico lá dentro!

 

Acessibilidade no Oceanário

 

Ao redor desse aquário gigantesco, são reproduzidos os ecossistemas de todos os oceanos, incluindo a temperatura de cada um, claro, senão os bichos e as plantas não sobreviveriam. Por exemplo, é muito frio no local onde estão os pinguins, mas muito quente onde é reproduzida a floresta tropical. Por isso, leve agasalho que seja fácil de vestir e retirar.

Felizmente, é tudo acessível para cadeirantes! Nós temos acesso aos dois andares e também ao banheiro.

Separe pelo menos duas horas para visitar a exposição permanente sem pressa. É bonito demais para ver correndo!

 

Vasco é o mascotinho do Oceanário. Assim que nos aproximamos do local, nós o vemos se preparando para um mergulho nas águas do Oceanário.

Vasco é o mascotinho do Oceanário. Assim que nos aproximamos do local, nós o vemos se preparando para um mergulho.

 

Deu fome?

 

Sem dúvida, após o passeio no Oceanário, já estaremos com fome!

Do lado de fora, há fast-foods, e, andando um pouquinho em direção à avenida, podemos ver vários restaurantes, incluindo um brasileiro… Também há um shopping nas proximidades, onde é possível ter mais variedade.

Para finalizar esta parte, quero te contar que, na origem, este post foi feito para crianças, com uma linguagem adaptada a elas e mais detalhes. Para ter acesso a ele, é só clicar aqui.

Agora, confira um videozinho que gravamos lá, usando o celular (daqueles antigos… rs), mostrando o peixe-palhaço. Preste atenção às expressões de encantamento das crianças, ao verem o “Nemo”!

 

 

Largo do Chiado

 

Sem dúvida, este é um ponto turístico que tem a preferência de muita gente!

Você pode chegar lá a pé, a partir da Praça do Rossio, mas, como há ladeiras, ou você usa scooter, ou precisará de empurradores dispostos e com braços fortes.

Talvez, o caminho mais simples seja passando por dentro do shopping Armazéns do Chiado…

Também é possível ir de táxi, mas tenha em mente que ele vai precisar dar umas voltinhas, pois as ruas em Lisboa costumam ter mão única.

É um local charmoso, onde encontramos o café A Brasileira, com a famosa estátua de Fernando Pessoa. Do lado de dentro está sempre lotado, e do lado de fora as mesinhas ficam sobre uma parte bem elevada.

Então, será necessário guindaste para subir… Espero que tenha levado algum na mochila. hahaha

 

Esta foto é um clichê. Todo mundo faz esse clique! Mas é irresistível tirar foto com a estátua de Fernando Pessoa na cafeteria A Brasileira... rs

Esta foto é um clichê. Todo mundo faz esse clique! Mas é irresistível hahaha

 

Para concluir, lembre-se de que aqui, no blog, há outros posts sobre Portugal, com novas fotos e dicas.

Fico por aqui, esperando que tenha apreciado o passeio. Se tiver dúvidas ou sugestões, deixe um comentário, combinado?

 

Um grande beijo,

Laura

 

Imagem com a frase "Para quem quer se aprofundar no assunto"

Para saber mais:

 

  • Posts neste blog

Hotel acessível em Lisboa

Visitando Lisboa em cadeira de rodas 2

De cadeira de rodas em Portugal: Queluz, Cintra e Alentejo

 

  • Posts do antigo endereço do Cadeira Voadora (mais detalhados)

Portugal para cadeirantes

Passeando por Lisboa de cadeira de rodas

Hotel acessível em Lisboa

 

  • Posts de outros sites e blogs:

Lisboa: como ir do aeroporto à cidade

Transportes (Acessibilidade) | Blog Lisboa (In)Acessível

Página-guia de Lisboa no site Viaje na Viagem

Site do Oceanário

 


Fique com Fernando Pessoa…

 

O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.

(…)

Pelo Tejo vai-se para o Mundo.

Alberto Caeiro, in “O Guardador de Rebanhos – Poema XX”
Heterónimo de Fernando Pessoa

 

Pôr do sol visto da Praça do Comércio, no deque sobre o Rio Tejo

Pôr do sol visto da Praça do Comércio, no deque sobre o Rio Tejo

 

About Laura Martins

Laura Martins criou o blog Cadeira Voadora em 2011 para compartilhar suas experiências de viagem em cadeira de rodas. Para ela, viajar desenvolve inúmeras habilidades, nos faz menos intolerantes por conviver com as diferenças e ajuda a construir inclusão, porque as cidades vão ficando mais preparadas à medida que as pessoas vão se fazendo visíveis. Entre em contato pelo e-mail contato@lauramartins.net.

8 Comments

  1. Raimundo Wilson Gonçalves

    Muito bom artigo, tenho prótese na perna esquerda, provável que precise de cadeira de rodas na visita a Portugal

  2. Olá! Gostei muito do post! Sou de Lisboa e realmente ainda é uma cidade que precisa de muitos retoques em termos de acessibilidade, nunca tinha dado por isto até ao começo deste ano em que comecei a sair sozinha com um dos meus melhores amigos (que é cadeirante). Temos tido imensas dificuldades em variar os percursos que fazemos exatamente pela falta de chão plano… Mas penso que com o tempo todo vai mudar e quem sabe no dia em que voltar cá tudo esteja mais composto!

  3. Olá Laura! Sou cadeirante, tenho 64 anos e estamos ( eu e minha esposa) planejando viajar a Lisboa, Munique, Verona, Florença e Roma. QuAis hoteis se encontra uma acessibilidade adequada nos quartos e banheiros- sem banheira? Em qual hotel ficaste nesses locais?

  4. Patricia - Turomaquia

    Brigaduuuu pela indicação do Turomaquia!
    beijos

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