Em 2016, o jornalista Jairo Marques esteve em Belo Horizonte para lançar seu primeiro livro, Malacabado, e palestrar para estudantes de Comunicação. Mariane Ster te conta como foi!
Por Mariane Ster
No último dia 23 de agosto, nós, de Belo Horizonte, contamos com a ilustre presença do escritor e jornalista Jairo Marques, no dia do lançamento do programa Pró-Equidade do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), fazendo também na capital o lançamento de seu livro Malacabado – A história de um jornalista sobre rodas. No dia 24, ele falou a estudantes do curso de Comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), novamente divulgando seu livro.
Buscando equidade
Jairo foi um dos convidados a participar do lançamento do Programa Pró-Equidade, uma vez que o projeto tem como objetivo realizar, ao longo deste e do primeiro semestre de 2017, ciclos de debates incentivando a discussão sobre preconceito, discriminação e equidade.
O primeiro desses ciclos, “Visibilidade Trans”, foi realizado nos dias 24, 30 e 31 de agosto, contando com pessoas representativas do segmento das pessoas trans. Em outubro, será realizado o ciclo de debates que terá como eixo principal as pessoas com deficiência, nos mais diferentes aspectos da vida social: trabalho, emprego, educação, saúde, convívio familiar e social, etc.
Em sua fala, Jairo demonstrou estar bastante emocionado com o trabalho proposto pelo BDMG, especialmente porque corre o Brasil já há algum tempo para falar de equidade e inclusão.
Sua emoção acabou contagiando a todos quando apresentou um texto escrito em 2014 pela garotinha Sofia. O texto foi publicado no blog Assim como você e pode ser encontrado aqui.
Medos, sonhos e calçada esburacada
A fala de Sofia emociona porque, com sua escrita infantil, ela deixa claro que seus medos e sonhos andam não somente na sua, mas nas cabecinhas da maior parte dos nossos pequenos. Acontece, porém, de ela ser uma pessoa com deficiência e isso gerar situações com as quais ela parece ter aprendido a lidar bem cedo. Sua vida tem a escola, os amigos, o cachorro, assim como a calçada esburacada e as dores causadas pelas sessões de fisioterapia e cirurgias necessárias a sua qualidade de vida.
Jairo autografou livros e conversou com a turma malacabada e a não-malacabada que foi ao BDMG especialmente para ouvi-lo. Muitas risadas e contação de alguns causos, como convém a nós mineiros.
Palestra na UFMG
O tema da palestra para alunos do curso de Comunicação da UFMG foi Comunicação e diversidade: desafios da abordagem e representação.
Ele defende que os estudantes de jornalismo precisam conhecer mais sobre o tema diversidade se quiserem entender como ocorre a atuação das pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
Além disso, chamou a atenção para questões como o discurso da superação, que, em grande medida, acaba por eximir o Estado de suas obrigações para com a população em geral, uma vez que coloca a obrigação do sucesso exclusivamente no indivíduo.
Jairo ainda chamou a atenção para um comportamento ainda bastante percebido, que é aquele segundo o qual a pessoa com deficiência é vista como um exemplo simplesmente por viver sua vida, se divertir, frequentar festas, estudar, namorar…
Crenças limitantes
Como jornalista, é grande sua preocupação com a forma com que as pessoas com deficiência são vistas pelas outras pessoas e pelos veículos de comunicação: como alguém a quem falta algo, simplesmente por sua condição física.
É uma percepção já clássica: vê-se primeiramente a deficiência e só depois se percebe o humano. Além do quê, gera-se uma crença segundo a qual nós, pessoas com deficiência, estamos fadados a sermos sempre os tutelados e nunca seres autônomos, capazes de tomar decisões acerca de nossos empregos, carreiras, dinheiro, namoros, moradia, etc.
O evento da UFMG contou ainda com a presença mais que especial do Dudu do Cavaco, que recebeu Jairo com música e um sorrisão.
Nada sobre nós sem nós
Seja em uma abordagem mais emocionante, como foi a fala dele no BDMG, seja em uma apresentação voltada para futuros colegas de profissão, o que se percebe é que Jairo é uma pessoa de absoluta importância para as pessoas com deficiência do país.
Praticante e incentivador do antigo, mas sempre válido, nada sobre nós sem nós, sua fala acaba por representar toda uma parcela da população que diariamente enfrenta olhares, calçadas e adaptações feitas, não raras vezes, por alguém que nunca as utilizará.
Poliomielite
Com seu Malacabado, Jairo deu voz aos sobreviventes de uma tragédia brasileira que foi a infecção de milhares de crianças pelo vírus da poliomielite na década de 1970, entre os quais me incluo.
Ele conta a sua história, é certo. Mas ela acaba sendo nossa, pasmem, por causa de um vírus de potencial destruidor. É certo que cada um enfrenta suas tragédias a seu modo, mas a pólio universaliza algumas coisas. Uma delas é um gigantesco gasto de energia e tempo com um “voltar a andar” distante e sem esperanças que sejam nossas. Mas estes poderiam ser gastos com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos cadeirantes ou mesmo daqueles cujas sequelas não tenham sido graves.
Fica o conselho precioso e gratuito: vacinem suas crianças contra a pólio. Viver sobre uma cadeira de rodas é possível. Sendo feliz, inclusive. Mas, para que fosse possível viver sobre uma cadeira de rodas, primeiro foi necessário ver a cara da morte, loteria absolutamente desnecessária.
Para fechar, recomendo a leitura do Malacabado, inclusive a quem não é malacabado. Aos malacabados, por motivos óbvios; aos não-malacabados (ou seriam bem-acabados?), para entenderem que, parafraseando Herbert Viana, em cima dessa cadeira também bate um coração.
Para saber mais:
Laura Martins entrevista Jairo Marques
Entrevista do jornalista Paulo Madrid com Jairo Marques (TV UFMG)
Para ler o outro post de Mariane Ster no Cadeira Voadora, clique aqui.