O que você faria se não tivesse medo?

O medo não é ruim em si, eu aprendi. É uma emoção e, como tal, surge naturalmente, quando deparamos com uma situação que representa risco. Sua função é nos deixar mais alertas para nos proteger do perigo.

Contudo, o medo também pode paralisar. Quando, diante de um sonho, um desejo profundo, não nos permitimos um passo adiante por causa do medo, então é hora de parar para avaliar a situação e crescer com ela. Mas como?

 

Muitos dos nossos atos cotidianos constituem verdadeiro heroísmo

 

O medo na vida das pessoas com deficiência

 

O medo é um velho conhecido das pessoas com deficiência, e isso é compreensível, afinal a maioria de nós vive em um contexto de exclusão. Então, enfrentamos inúmeros desafios para que possamos seguir a vida com o mínimo de conforto, segurança, tranquilidade e satisfação.

Uma simples saída de casa, por exemplo, pode representar o confronto com vários riscos, mais ou menos importantes, reais ou imaginários, mas que jamais deveriam ser desconsiderados.

  • Passeios em más condições podem oferecer risco de queda; no mínimo, risco de piorar espasmos em pessoas com lesão medular, e isso ocorre por causa da trepidação da cadeira de rodas.
  • Calçadas sem rebaixamento representam risco de que a circulação com cadeira de rodas se transforme em frustração e a pessoa tenha de procurar uma rota alternativa, usar o automóvel ou  retornar ao lar.
  • A falta de preparo para lidar com quem tem deficiência pode ser um grande dificultador. Quem é que gosta de ser observado com o canto do olho, como se fosse um extraterrestre? De ser olhado com pena?

 

Reprimir o medo não faz com que deixe de existir

 

Vários de nós, pessoas com deficiência, enfrentam esses riscos e saem da segurança do lar, não sem passar por dificuldades e frustrações, maiores ou menores. Afinal, enfrentar riscos e desafios faz parte da vida de todo ser humano, com deficiência ou não.

Vários outros não não percebem que sentem medo, o que também produz danos. Não é porque reprimimos o medo que ele deixa de existir ou de afetar o modo como nos relacionamos com a vida e com outras pessoas. O pior é que o medo reprimido dificulta a interação e pode reduzir o prazer e a satisfação; consequentemente, é um obstáculo para que realizar nossos sonhos.

Então, o que fazer?

 

Vale a pena compreender o medo e aprender a lidar com ele. (Imagem retirada do site Neurociências em Benefício da Educação)

Vale a pena compreender o medo e aprender a lidar com ele.
(Imagem retirada do site Neurociências em Benefício da Educação)

 

 

Medo convive com coragem?

 

Perceber o medo não faz de nós pessoas piores, apenas mostra que temos coragem de olhar para dentro e reconhecer limitações e fragilidades.

É comum ouvir pessoas com deficiência dizendo que os limites estão apenas em nossa cabeça e, portanto, não há limites para quem é corajoso e vai à luta.

Minha visão é diferente. Penso que os limites existem sim, o que não quer dizer que não possamos lidar com eles inteligentemente. E não estou me referindo apenas à inteligência intelectual, mas também à emocional, entre outras, conforme aprendemos com o psicólogo Howard Gardner.

(Re)conhecer as próprias habilidades e fragilidades é, na verdade, demonstração de maturidade e coragem. Além disso, é um passo importante para avaliar as possibilidades de nos lançarmos a novas aventuras – mesmo que seja abrir a porta da casa e ir até a esquina.

 

Seja corajoso. Corra riscos. Nada pode substituir a experiência.

 

Bater asas?

 

Para lidar com o medo, podemos confrontar nossas condições com as circunstâncias externas, mas sempre precisaremos experimentar, porque não dá pra ficar somente nas especulações.

A partir daí, é bom bater asas, na proporção em que cada um se considera capaz. Com a segurança e o conforto possíveis, mas nos lembrando de que “esfolar joelhos” faz parte da brincadeira!

Não se trata de ser negligente, nem irresponsável, nem covarde. Nem um extremo, nem outro.

Se percebermos que o medo bate, avaliamos se temos condições de bater asas mesmo assim e se os perigos são reais ou imaginários. A coragem permite o enfrentamento das situações, ainda que estejamos com medo. Coragem está longe de ser ausência de medo… Coragem é perceber que existe algo mais importante que o medo.

 

É preciso reaprender a brincar. Procure conviver mais com as crianças! (Imagem retirada do Google)

É preciso reaprender a brincar. Procure conviver mais com as crianças!
(Imagem retirada do Google)

 

Bola fora…

 

Nesse processo, duas coisas podem nos atrapalhar:

  • Deixar que o medo paralise a ação. Ou seja: não agir.
  • Agir como se o medo não existisse, desrespeitando a nós mesmos. Podemos agir sentindo medo, desde que avaliemos a situação. Mas não vale a pena agir sem considerá-lo, porque ele é como uma importante placa de sinalização numa estrada.

Se o medo bloqueia nossos voos, quem sabe seja hora de buscar ajuda para trabalhar a situação? Talvez, para levantar voo, precisemos recorrer ao apoio de alguém querido, ou de um profissional da área da psicologia ou da psiquiatria que nos assessore no início. Isso não representa demérito algum.

Só não podemos nos permitir que passe mais uma temporada sem que realizemos o sonho de ir, simplesmente ir. Só isso.

 

Passarinho não foi feito pra ficar parado. Eu sei que você quer voar... Então vá!

Passarinho não foi feito pra ficar parado. Se você deseja muito voar… então vá!

 

Eu também sinto medo

 

Se eu sinto medo? Sim, é claro; afinal, sou humana. Às vezes o medo me paralisa, mas apenas momentaneamente, porque logo arrumo um jeito de compreender a mensagem que ele tem para mim, com auxílio terapêutico ou dos amigos – e muita reflexão.

Então, às vezes o medo passa; às vezes não. Algumas vezes percebo que vou precisar agir mesmo estando com medo, e é isso que faço, com muita vontade, após ter avaliado a situação.

E é por isso que hoje existe o Cadeira Voadora e que compartilho experiências de viagem. O medo não é senhor dos meus passos, ele é só professor.

Com isso retorno à pergunta do título: o que você faria se não tivesse medo?

Feliz ano novo! Felizes voos!

 

Assim eu enxergo a missão do Cadeira Voadora... (Inspirada ilustração da Carol Porto, que ela me deu permissão para usar no blog)

Assim enxergo a missão do Cadeira Voadora…
(Inspirada ilustração da Carol Porto, que ela me deu permissão para usar no blog)

 

 

Para saber mais:

 

Para entender a função do medo, clique aqui e assista a um vídeo de apenas dois minutos.

Para compreender melhor o medo e aprender a lidar com ele, sugiro estes fantásticos filmes:

Up – Altas aventuras

A vida secreta de Walter Mitty

Divertidamente

 

Não perca tempo: é duro quando a gente se arrepende por não ter tentado... (Imagem: divulgação do filme "A vida secreta de Walter Mitty)

Pode ser duro quando a gente se arrepende por não ter tentado…
(Imagem: divulgação do filme “A vida secreta de Walter Mitty)

 

 

About Laura Martins

Laura Martins criou o blog Cadeira Voadora em 2011 para compartilhar suas experiências de viagem em cadeira de rodas. Para ela, viajar desenvolve inúmeras habilidades, nos faz menos intolerantes por conviver com as diferenças e ajuda a construir inclusão, porque as cidades vão ficando mais preparadas à medida que as pessoas vão se fazendo visíveis. Entre em contato pelo e-mail contato@lauramartins.net.

2 Comments

  1. Vou assistir A VIDA SECRETA DE WALTER MITTY agora! Está disponível no youtube e no netnow, pra quem é assinante da net tv! 😉 Vi o trailler e parece bem interessante!

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