De cadeira de rodas em Buenos Aires – Parte 1

Estive em Buenos Aires em maio de 2010, em mais uma aventura de cadeira de rodas. Estou me preparando para retornar este ano (2011), pois me apaixonei pela cidade.

Para mim, viajar é das experiências mais prazerosas da vida. Então, quero muito compartilhar essas experiências com vocês, com a esperança de incentivar mais cadeirantes e outras pessoas com deficiência a sair pelo mundo, apesar das dificuldades, que não são poucas. Mas o “sacrifício” é compensador.

Vambora?

 

Notas:

  • Todas as fotos pertencem ao acervo Cadeira Voadora e não podem ser utilizadas sem autorização expressa.
  • Este post estava no antigo endereço do Cadeira Voadora, no Blogspot, e foi transcrito aqui com poucas alterações. Ainda o considero bastante útil, porém considere que algumas informações podem estar desatualizadas. Por isso, no Para Saber Mais, abaixo, deixo links para acesso a informações mais recentes.

 

Primeiras impressões

 

Neste passeio a Buenos Aires, viajei com minha mãe e meu irmão Ulysses. A cidade é deliciosa e respira cultura!

São muitos teatros, quase uma livraria em cada quarteirão, apresentações artísticas o tempo todo nas ruas e charmosos cafés em cada canto.

É uma curtição flanar na Recoleta ou em Palermo, por exemplo. Nada pra fazer, só admirar as áreas verdes, a arquitetura, as lojinhas e bater ponto em algum café elegante e charmoso.

 

Acessibilidade geral

 

Porém, a cidade ainda não está bem preparada para receber pessoas com deficiência. Há poucas calçadas rebaixadas, e as que existem estão quebradas.

Também há poucos banheiros acessíveis, e imaginem o que é passear sem saber se vai encontrar um lugar onde fazer xixi…

 

Uma das inúmeras bancas de flores da Calle Florida

 

Muitos espetáculos de tango e apresentações musicais acontecem no subsolo ou no andar de cima, com extensas escadarias para transpor. Haja braço forte dos amigos ou de desconhecidos…

Desse modo, é difícil um cadeirante circular sozinho pela maioria dos espaços, e, mesmo com ajuda, não é fácil entrar em muitos lugares.

Mas não é impossível.

 

Aonde é possível ir?

 

Dependendo da condição do cadeirante tocar sua própria cadeira, dá pra circular em alguns lugares até mesmo sozinho, com autonomia.

Como exemplos, posso citar:

♥ A Calle Florida, que é um calçadão, onde os carros estão proibidos de circular. Lá, fica uma das entradas para o shopping Galerias Pacífico. Passando por ali, vai encontrar acessibilidade para entrar e para usar o sanitário.

♥ O Malba (Museu Latino-Americano de Arte Moderna) é onde estão obras como o Abaporu, da brasileira Tarsila do Amaral, e um autorretrato da mexicana Frida Kahlo, que, por sinal, também foi uma pessoa com deficiência física.

 

Estou em frente ao Malba

 

Em todos os quarteirões do Centro por onde passei, há calçadas rebaixadas. Porém, praticamente todos os rebaixamentos estão quebrados ou têm um desnível de cerca de dois, três centímetros em relação ao asfalto.

A boa notícia é que, até onde pude perceber, a cidade em geral é plana, o que facilita bastante nossos deslocamentos.

 

Dicas de roteiro!

 

Há um post exclusivo com dicas, combinado? Mas você já pode checar algumas aqui!

 

El Ateneo

Para começar, não se esqueça de colocar na lista, com destaque, a livraria El Ateneo Grand Splendid, na Avenida Santa Fé. É esplendorosa!

Anteriormente, o local foi um teatro, e hoje dá lugar a uma das maiores livrarias da América Latina, assim como uma das mais lindas do mundo. Os balcões do antigo teatro hoje comportam prateleiras com livros, CDs e DVDs.

Como acessibilidade, tem entrada plana, elevador e banheiro acessível. Uma rampinha íngreme dá acesso ao palco, onde se localiza o café.

 

Jardim Japonês e Rosedal

 

Dá para passear no Jardim Japonês, que é muito bonito. Porém, tendo mobilidade reduzida, as pontezinhas podem ser inacessíveis, particularmente a que tem degraus em uma das extremidades. Mas, para circular pelo local, fica fácil, por causa do piso com asfalto.

Já no Rosedal, que é maravilhoso, a circulação fica difícil por causa das pequenas pedras que revestem os caminhos e dificultam bastante o transitar com a cadeira. Além disso, não havia rebaixamento das calçadas para entrar no parque onde ele se localiza. Uma pena, porque é um passeio imperdível.

No local, há diversos recantos muito inspirados e inspiradores, como o Pátio Andaluz, que, infelizmente, tinha escadas…

Por fim, não se pode falar do Rosedal sem mostrar as rosas! E elas estão lá, aos milhares, segundo informações oficiais. Várias espécies venceram concursos, e há as que foram consideradas as mais perfumadas. É claro que fui conferir o aroma, me empoleirando sobre o canteiro, correndo o risco de cair e ainda levar uma bronca por ter esmagado alguma flor! hahaha

Mas é irresistível!

No Rosedal, pedriscos revestem o piso, e eles são horríveis para quem tem mobilidade reduzida

 

Floralis e Planetário

 

Bem perto do Rosedal, fica a bela escultura chamada Floralis Generica, que tem uma programação para abrir as pétalas quando o céu está claro. Dá pra chegar bem pertinho de cadeira de rodas, mas contenha a animação, porque equipamentos eletrônicos vivem dando defeito, né?

Bem perto, está o Planetário de Buenos Aires. Nele, encontrei algum acesso para cadeirantes, como uma plataforma elevatória para superar as escadas, mas sem nenhuma segurança, nenhuma proteção. Acho que fui uma louca de me deixar transportar naquele troço, mas tudo bem, sobrevivi.

 

 

Recoleta, Palermo e Centro

 

Passear pela Recoleta e por Palermo possibilita conhecer a bela arquitetura, muitas vezes inspirada na francesa, e encontrar cafés e lojinhas muito charmosos. Mas será necessário um braço forte para ajudar a empurrar a cadeira de rodas, pois, novamente, quase não há rebaixamento nas calçadas. Falarei mais a respeito no próximo post.

 

Arquitetura francesa na Recoleta

 

Josephina e La Biela, na Recoleta, são cafés onde encontramos entradas planas. Ambos são muito agradáveis, e o primeiro tem banheiro que dá para ser acessado por quem usa cadeira de rodas.

No Alvear Palace Hotel, há uma plataforma elevatória na entrada, o que permitirá que o cadeirante entre para conhecer a imponente arquitetura, os lustres de cristal e as passarelas persas, ou para tomar o café da manhã, o chá da tarde ou o brunch dominical. Programa de rei ou de rainha, e acessível (bem, não estou me referindo ao aspecto financeiro…).

No centro, não deixe de ir ao tradicionalíssimo e elegantérrimo Café Tortoni. De manhã não é tão cheio e só tem um pequeno degrau na entrada. Perguntei se havia rampa móvel, e imediatamente os garçons a trouxeram. Porém, era menos perigoso subir o degrau, já que ela era excessivamente íngreme…

 

 

Hospedagem e transporte

 

Sempre recomendo que, quando for escolher hospedagem, considere um local que facilite seus deslocamentos, tanto a pé, quanto de táxi, automóvel por app ou metrô. Afinal, é ótimo não ter que pegar transporte para passear ou curtir a noite, não é mesmo? E até para comprar algo na farmácia, ou no mercado…

Nos hospedamos no Hotel Meliá Buenos Aires, na Rua Reconquista, no Centro. Definitivamente, o custo não foi baixo, mas também não foi proibitivo. E, por outro lado, ele nos ofereceu muito conforto e também segurança, conforme vou te mostrar no próximo post.

 

Transporte

Para pegar táxi, algumas dicas: agende por telefone, por questões de segurança, e peça um carro cujo porta-malas caiba a cadeira de rodas, pois grande parte deles funciona a gás, e o cilindro preenche todo o espaço.

Não poderei lhe dar informações sobre o metrô, porque não utilizamos.

 

Companhia aérea

 

Voamos pela TAM e não tivemos problemas nesta viagem. O atendimento a bordo foi muito atencioso, e as comissárias fizeram de tudo para tornar minha viagem mais confortável.

Foi possível utilizar o toilette, pois havia uma cadeirinha de bordo que passava no estreito corredor. Porém, é necessário que a pessoa com deficiência tenha algum equilíbrio de tronco e movimentos de braço para fazer a transferência da cadeira para o vaso sanitário. Ou, então, que esteja na companhia de alguém que consiga auxiliá-la. Isso, porque comissárias/os não têm autorização para ajudar dentro do toalete.

Ao adquirir sua passagem, registre, no site ou por telefone, que tem necessidade de usar sua cadeira de rodas até a entrada da aeronave e de ser acompanhado até lá. E, como as poltronas destinadas às pessoas com deficiência não podem ser marcadas nem pela internet, nem por telefone, chegue mais cedo ao check-in para solicitá-las.

Para finalizar, se não tiver reserva de transfer e precisar de transporte ao chegar a Buenos Aires, tome cuidado com os motoristas clandestinos. Chegamos pelo aeroporto de Ezeiza, e lá há um quiosque de táxi. Evite passar perrengue e, mesmo que seja mais caro, considere contratar o veículo neste local.

 

Para falar com os “hermanos”

 

Meu irmão João Antônio me ensinou algumas frases para que eu pudesse me comunicar com os gentis portenhos, que fazem todo o esforço para nos compreender, mas não custa dar uma forcinha! Acompanhe:

 

Saludando a los hermanos

Buenos días, buen día / Buenas tardes / Buenas noches

Para perguntar como estão: Hola, ¿qué tal?    Hola, ¿cómo estás?  Hola, cómo te va?

Respondendo: Bien, ¿Y tú?    Bien, ¿vos?   Muy bien, ¿y tú?

Pidiendo informaciones

Perdón, disculpa / Permiso (com licença)

Permiso, ¿sabe dónde está el baño (ou toilette)?   ¿Sabes dónde hay un baño cerca de acá?

En el restaurante (restaurant)

Mozo (garçon) Yo quiero una mesa para tres personas, porfavor.

La carta, por favor.

Mozo, (tráeme) la cuenta porfavor.

Mozo, nuestro cambio. ¿Tienes cambio? ¿Tienes más pequeño?

Muchas gracias.

Mozo, ¿puedes llamarme un taxi, por favor?

Para decir adiós

Buenas noches, hasta luego, chao, hasta pronto.

Dica maneira: Em Buenos Aires, as letras ll têm som de ch. Então, calle se pronuncia cache.

 

Buenos Aires: bom destino para principiantes

 

Sem dúvida, Buenos Aires é um bom destino para cadeirantes e outras pessoas com deficiência que estão começando a se aventurar fora do Brasil. Aliás, é uma boa pedida para qualquer pessoa!

Para começar, são poucas horas de viagem aérea. Além disso, como a língua é o espanhol, é mais fácil entender e se fazer entendido, mesmo que não se tenha familiaridade com o idioma.

Ainda que não seja uma cidade que investiu muito em acessibilidade, a que existe permite fazer diversos passeios agradáveis e aprender bastante com a rica cultura.

Para finalizar, saiba que, como regra geral, nossos hermanos são bastante simpáticos e fazem de tudo para compreender o que dizemos, ainda que não saibamos uma palavra de espanhol. Mas, é claro, é bom aprender algumas expressões básicas do idioma, para facilitar a comunicação, não é mesmo?

Além disso, não foram poucas as vezes em que pessoas espontaneamente ofereceram ajuda para que eu saísse de algum café ou restaurante com degrau na entrada.

Em resumo, você vai se divertir muito, se encantar e até fazer amizades!

No mais, boa viagem! A nossa foi ótima.

Ahhh, esqueci de dizer que tem mais 4 posts sobre a cidade, tá? Confira abaixo!

 

Para saber mais

 

Posts sobre Buenos Aires no antigo endereço do Cadeira Voadora

Buenos Aires de cadeira de rodas 2 – Restaurantes e hotel

Buenos Aires de cadeira de rodas – Parte 3

Mais fotos de Buenos Aires

 

Dica do Eduardo Câmara, do blog Mão na Roda:

Consulte o Guia Óleo., pois, segundo ele, “Esse guia de restaurantes tem uma busca (http://www.guiaoleo.com.ar/nav_pro.php) que mostra os lugares com acesso e também com banheiro adaptado. As informações são corretas e há quase 1.000 restaurantes com banheiro adaptado no guia!”. 

Minha dica é que você consulte também o Google Maps e o app Guiaderodas.

 

Outros blogs

    • Aqui, você lê o post que a jornalista Gisele Teixeira, brasileira radicada em Buenos Aires, fez sobre a minha experiência na cidade. Ah! O blog dela é muito útil para quem ama Buenos Aires. Este é o novo endereço.
    • Neste link, está o post que fiz para o blog Buenos Aires Dream. Nesse blog, você também vai encontrar montes de dicas confiáveis sobre a cidade.
    • Clique aqui para saber mais sobre os hábitos da cultura local.

 

About Laura Martins

Laura Martins criou o blog Cadeira Voadora em 2011 para compartilhar suas experiências de viagem em cadeira de rodas. Para ela, viajar desenvolve inúmeras habilidades, nos faz menos intolerantes por conviver com as diferenças e ajuda a construir inclusão, porque as cidades vão ficando mais preparadas à medida que as pessoas vão se fazendo visíveis. Entre em contato pelo e-mail contato@lauramartins.net.

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