“O Touro Ferdinando” é uma animação que deve ser conferida, porque traz muito material para reflexão sobre o respeito por si mesmo, em primeiro lugar, e, por extensão, o respeito às diferenças.
(dedicado, com gratidão, à Fabrícia)
Ferdinando vive em uma fazenda da Espanha junto com o pai e outros touros de sua idade, preparados para participar de touradas. Mas imagine um animal tranquilo e fofo, que gosta de flores e detesta brigas… É ele!!! Você já pode imaginar o bullying, né? E também é possível que possa imaginar sua luta em busca da liberdade de ser quem é.
À procura de si mesmo
Em poucos minutos de filme, já nos sentimos amigos de infância do amável touro de olhos sensíveis. E então torcemos por ele quando decide fugir e vai parar numa fazenda de gente muito pacífica que cultiva flores. Vira amigo da Nina, uma garotinha apaixonante, e se sente no paraíso.
Até que, por causa de um incidente, é obrigado a retornar à antiga fazenda. Está crescido, é um touro robusto, que mete medo — mas continua doce e amante da paz.
Não será simples esta etapa de sua vida, pois é intenso o embate entre o que ele é e o que os outros exigem que seja. Mas ele descobre algo fundamental: aceitando ou não as imposições para que lute na arena, será um touro morto se permanecer na fazenda. Se lutar, será morto pelo toureiro; se não lutar, seu destino é o matadouro.
Quando não nos sentimos “normais”
Acompanhamos toda a luta interna de Ferdinando por não se sentir como um touro “normal”, sem deixar de observar a pressão externa para que ele se enquadre nos padrões. Os expectadores que também não se enquadram na sociedade padrão vão se identificar imediatamente com o personagem e torcer por ele até o fim, é claro.
São várias as aventuras (e desventuras) vividas por Ferdinando até finalmente chegar à Praça de Touros para enfrentar El Primero. Vale muito acompanhar, naqueles poucos minutos de luta, tudo o que se passa no microcosmos do doce touro: os medos, as escolhas, as emoções. Tudo que foi vivido desemboca ali, e não é possível fugir.
O outro não me aceita?
Penso que o filme aborda com sensibilidade a questão da autoaceitação e da autoafirmação.
Não adianta ficar repetindo o discurso de que “o outro não me aceita” quando nem eu mesma consigo me aceitar e me afirmar. E não é simples o processo de autoaceitação quando destoamos dos padrões e das normas.
Melhor mesmo é assumir, corajosamente, que não sou quem gostaria de ser. E também assumir a responsabilidade por aprender a amar quem sou.
Este é o caminho que eu, Laura, escolhi trilhar. Não é que eu não veja a responsabilidades social pela intolerância e o desrespeito às diferenças; escolhi também lutar contra isso, à minha maneira. Uma coisa não elimina a outra. O que não me parece saudável é me colocar no lugar de vítima da sociedade. Definitivamente, a força vem de dentro, e não aceito o papel de vítima.
Enfim, vale muito acompanhar todo o processo pelo qual passou Ferdinando. Todos nós, em algum momento, somos levados a enfrentar nossos medos em praças públicas, tal como ele teve de enfrentar o toureiro e a sociedade, não é mesmo?
E então, como será que Ferdinando se saiu?
Definitivamente, a força vem de dentro, e não aceito o papel de vítima.
Curiosidades
O Touro Ferdinando é uma obra de arte dirigida pelo brasileiro Carlos Saldanha, o mesmo de Rio e A era do gelo! Ele tem duas indicações ao Oscar, e uma delas na categoria “Melhor longa de animação”. E adivinha por qual filme? Isso mesmo, o Touro!
Outra curiosidade é que a voz do touro, na versão original, é encorpada, feita por John Cena, que tem uma carreira celebrada como lutador! Segundo Carlos Saldanha, foi uma combinação perfeita, porque Cena é fortão, mas extremamente gentil.
Para saber mais:
“O Touro Ferdinando foi meu filme mais difícil, mas é um dos mais emocionantes”, diz Carlos Saldanha
Nota: Infelizmente, o filme não está disponível na Netflix. Assisti no Now, no Telecine. 😍 Veja abaixo o trailer.
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