Escola da Ponte, em Portugal: acessibilidade

Estou na estação em Vila das Aves, aguardando o trem para retornar a Porto.

Faz dois anos que partimos para a Europa a fim de realizar um sonho: conhecer a Escola da Ponte. Ela é movida por uma pedagogia de vanguarda que ficou conhecida no Brasil em razão de uma série de crônicas publicadas pelo escritor Rubem Alves.

Mas o que você não deve suspeitar é que, apesar de ter virado o Google de cabeça para baixo, ele nada me revelou a respeito da acessibilidade, tanto para chegar ao local, quanto na própria escola.

Mas fomos mesmo assim. E é esta aventura que te conto agora!

 

Ir a Portugal para visitar uma escola?

 

Minha amiga Helena foi quem fez o convite: “Laura, topa ir a Portugal conhecer a Escola da Ponte? A gente aproveita para visitar Porto e depois vai à Espanha…”. Topei na hora.

Quando acredito em algo, estudo o assunto e planejo formas de aplicar. Por isso, cheguei até a fazer um curso para entender melhor e aplicar a filosofia da Ponte, pela qual nós duas éramos apaixonadas.

Porém, ainda queríamos conhecer a Escola, e desse sonho compartilham milhares de pessoas. Apesar de ser muito visitada, há poucas informações na internet sobre como chegar lá, e não encontrei nada sobre acessibilidade.

Então, Helena entrou em contato com a Ponte e a partir daí iniciamos nosso planejamento para cruzar o oceano.

 

Perrengue na estação ferroviária

 

Pegamos o trem na Estação de São Bento, à qual comparecemos um dia antes, para adquirir as passagens e compreender como acessar o trem. Não adiantou muito, porque nem eles nos compreendiam direito, nem nós a eles. Teríamos feito melhor se nos tivéssemos orientado pelo site.

Chegamos cedo no dia da viagem. Você sabe: mineiro não perde trem, como diz o ditado, muito menos duas mineiras ansiosas para realizar um sonho… No fim das contas, o funcionário que deveria nos ajudar nos enrolou e não buscou a rampa móvel. Me pegou, inclinou a cadeira, e assim foi a “acessibilidade”.

Para descer em Vila das Aves, não houve problema, porque não havia desnível. Mas a estação estava deserta; não havia ninguém para nos dar informações. Esperamos um pouco e apareceu um táxi, no qual partimos para a vila ao lado, que talvez pudesse ser alcançada a pé, não fossem as ladeiras.

 

Praça em frente à Escola, em São Tomé de Negrelos

 

A Escola da Ponte é inclusiva?

 

A escola não se considera inclusiva, simplesmente pelo fato de que sempre aceitou todos os tipos de criança, já que considera que todos têm condições de aprender. Na visita, vimos alunos com deficiência intelectual assentados em mesinhas com colegas com e sem deficiência.

Não vou comentar sobre a pedagogia da Ponte para não alongar o post, mas deixarei alguns links abaixo, no Para saber mais. É suficiente dizer que os alunos são tratados como indivíduos, não como produto de linha de montagem.

As salas (não me lembro se todas) têm paredes móveis e se transformam de acordo com os trabalhos realizados. Temos permissão para adentrar os espaços, mas não para interromper as aulas, e os garotos não se distraem conosco.

As visitas são sempre em grupo, guiadas pelos alunos, e não podem ser fotografadas.

 

Voltando para Porto

 

Apesar de recorrer a métodos pedagógicos praticados literalmente há milênios, como o método socrático, a Escola da Ponte ainda pode ser considerada vanguarda. Isso porque, infelizmente, de modo geral, a educação pouco avançou no mundo.

Resolvemos descer o morro a pé, o que foi uma ideia horrível, porque não há passeios e a descida é excessivamente íngreme.

Mas ainda podia piorar…

Após descer a ladeira, chegamos à conclusão de que nossa caminhada terminaria ali, porque à frente havia um trecho em obras. Para alcançar a estação, seria necessário descer uma escadaria ou dar uma longa volta.

Nesse ponto, fomos acolhidas por uma tempestade que molhou até a minha alma, porque eu não havia saído do hotel preparada para isso. Paramos numa lanchonete, tomamos uma bebida quente e comemos algo, para ter forças de prosseguir.

Enfim, conseguimos pegar um táxi e chegamos até a estação. Agora, te pergunta: você acha que tivemos acessibilidade no retorno?

 

Helena e eu em frente ao portão da Escola, aguardando o horário de entrar

 

Tem rampa ou não tem?

 

Sem dúvida, a viagem de trem foi tranquila e confortável, tanto na ida quanto na volta.

No retorno, mesmo a Estação de São Bento sendo a terminal, avisamos que iríamos descer ali, para que tivessem tempo de providenciar a rampa.

Para nossa surpresa e alegria, a funcionária já estava trazendo a rampinha sem que precisássemos pedir. Porém, seu colega pediu que ela a guardasse, explicando que não seria necessária, pois ele mesmo me desceria. Quase não acreditei no que estávamos ouvindo…

Diante daquilo, tirei uma carta da manga, a melhor delas. Avisei que tinha um blog e que filmaríamos tudo para mostrar ao Brasil.

Então, foi assim que conseguimos que a rampa fosse estendida tal qual um tapete vermelho, com Helena filmando tudo. Não sei se é pra rir ou pra chorar…

 

 

Uma experiência para não esquecer

 

Não vai dar para esquecer esta viagem nunca, porque ela nos emocionou profundamente. Tenho saudades demais e gratidão à vida e à Helena, por ser a companheira perfeita para chegar lá. Ela é muito companheira e incansável!

Caso tenha deficiência física e queira visitar a escola, saiba que é possível, mas não cometa os erros que cometemos. Entre no site da Comboios de Portugal com antecedência, pesquise tudo detalhadamente, chegue mais cedo no dia da viagem e exija a rampa, tanto na ida quanto na volta. Disso depende a sua segurança, então não abra mão.

E jamais, jamais mesmo, invente moda: não suba nem desça o morro de São Tomé de Negrelos a pé. Pegue um táxi tanto na ida para a escola quanto na volta, para evitar problemas.

O edifício da escola tem elevador, os corredores são largos, e as mesas de trabalho adequadas para qualquer pessoa.

 

Para saber mais:

 

Comboios de Portugal | Informações ao cliente com deficiência

A escola com que sempre sonhei | Crônicas de Rubem Alves para baixar

A Escola da Ponte na Wikipédia

 

 

No vídeo a seguir, o professor José Pacheco explica sua experiência de exclusão e sua busca de mudar isso com a filosofia da Escola da Ponte.

 

 

About Laura Martins

Laura Martins criou o blog Cadeira Voadora em 2011 para compartilhar suas experiências de viagem em cadeira de rodas. Para ela, viajar desenvolve inúmeras habilidades, nos faz menos intolerantes por conviver com as diferenças e ajuda a construir inclusão, porque as cidades vão ficando mais preparadas à medida que as pessoas vão se fazendo visíveis. Entre em contato pelo e-mail contato@lauramartins.net.

2 Comments

  1. Saudades!!!!!!!! Foi muito Bom!!!!!!!!
    Precisamos repetir estas aventuras!!!!

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